18 maio 2011

Em português nos entendemos

O português, com diversas variantes fonéticas e caligráficas, é a língua de comunicação de diversas nações, na Europa, na África, na Ásia e na América. Se a língua tem a matriz latina, também colheu vocábulos nos diversos povos que aqui aportaram antes dos romanos, como sejam os fenícios (o sufixo ippo em Olisipo – Lisboa e Collipo – Leiria), os gregos, os celtas e os celtiberos (o sufixo briga que aparece, por exemplo, em Conímbriga).
A língua portuguesa tem a sua origem no latim e assim eram até D. Dinis escritos os documentos oficiais. Ao longo da nossa história houve diversas tentativas, particularmente na forma escrita, de aproximar a língua da matriz latina, Todas elas saíram goradas pela força da oralidade. O actual acordo é mais uma dessas cedências. A língua tem a sua origem imediata no chamado latim vulgar que o distingue do erudito e a origem popular é comummente aceite, “O Pacto de Gomes Pais e Ramiro Pais”, não oficial, é considerado o primeiro documento escrito em língua portuguesa.
O fenómeno de adopção de palavras de outras línguas continua até aos nossos dias. As invasões dos bárbaros não corresponderam em contribuição linguística à sua importância e longevidade e limita-se a alguns conteúdos: a guerra (guerra, roubar, espiar), as roupas (luva, fato), os animais (gansa, marta). Dos suevos e os visigodos herdámos palavras como aio, íngreme, espora, luva. Os árabes deixam-nos cerca de mil palavras em áreas específicas como a agricultura, os animais, as plantas (arroz, azeite, alface, açucena, alfarroba. Porém, a matriz latina sobrepõe-se a todas as invasões.
Em finais do século X iniciam-se as primeiras influências do francês. São daí a introdução dos vocábulos dama, chapéu e do sufixo -age “ -agem “. Será reforçada no século XIII pela instalação, em todo o território da Galiza e Portugal, das ordens monásticas francesas de Cluny e Cister. São desse período formas líricas próprias da literatura provençal e diversos vocábulos daí oriundos (trovador, alegre, frei).No século XVIII e XIX são introduzidos enormes francesismos, lembre-se a geração de 70.
A partir do séc. XV, a língua portuguesa enriquece-se com a contribuição das línguas indígenas (o bantu, o tupi e línguas asiáticas). A influência índia e africana transmitiram ao português numerosos vocábulos ainda hoje correntes: abacaxi, caipira, jacaré, batuque, samba. Tais marcas são testemunhos de uma primazia internacional do português, que durou até à metade do século XIX. Como hoje é o Inglês, o Português foi durante muitos anos a língua franca do comércio mundial.
Recentemente, fruto da globalização moderna, muitos vocábulos, particularmente ingleses, são adoptados.
O português moderno é obra de Garret e Eça. A frase liberta-se dos espartilhos clássicos e aproxima-se do falar do povo. Camilo, Aquilino, Júlio Dinis, Torga e mais recentemente Saramago e Agustina introduzem-lhe inúmeros vocábulos do linguajar popular, habitualmente pouco dignos de serem escritos e fazerem parte do objecto literário. Salvo o devido exagero, posso concluir que a língua portuguesa é primordialmente uma construção do povo.

3 comentários:

Anónimo disse...

Língua e personalidade

Grande foi o prazer que me deu a leitura deste artigo (de excelente doutrina linguística), postado por José Alegre Mesquita.

A seara da Língua portuguesa é vasta, e os obreiros poucos em face da imensidão dessa mesma seara.

É, pois, de júbilo o sentimento da messe do Idioma nacional, quando alguma colheita se apresenta grada na qualidade e farta na quantidade dos grãos cerealíferos!

E, se não, vejamos:

Peguemos numa palavrinha qualquer, humilde que seja, um som insignificante.

Por exemplo, esta exclamação - ah!
É representada por duas letras: um “a” e um “h”. E dita uma só vez - “á”.

Meditemos agora na multidão de significados que essa exclamação pode traduzir, em momentos “humanos” do viver humano...
- Pensemos num “ah!” de alegria, quando se almeja o que é ansiado longamente…
- Pensemos num “ah!” de tristeza, quando uma desilusão nos golpeia a alma…
- Pensemos num “ah!” de ternura, quando o coração todo se entrega, e apenas dá consentimento à boca para traduzir êxtase…
- Pensemos num “ah!” de vingança, de ódio, ou em qualquer outro produto do mal…

Se nisto pensarmos, concordaremos com aquela verdade que o grande Mestre D. João de Castro nos disse:

- “A palavra é quase a imagem do Mundo”.

Aqui chegado (e se é verdade que a “palavra é quase a imagem do Mundo), devo indagar:

Então: O que é Pátria?

Ouçamos o que nos diz Alexandre Herculano (Lendas e Narrativas):

“A língua e a religião são duas cadeiras de bronze, que unem no correr dos tempos, as gerações passadas às presentes, e estes laços, que se prolongam através das eras, são a Pátria…”.

Pátria é a terra dos antepassados (terra patrum), terra dos nossos Pais, no sentido em que nos deram a vida num ponto do Orbe que para nós é a melhor ambiência - o ar que respiramos, o solo que pisamos, as igrejas onde oramos - tudo isso foi o cenário parecido, semelhante ou igual dos nossos antepassados.

Ora:

- Se nós vamos à igreja, e dizemos “Deus” nesta intensa palavra portuguesa, e se os nossos Pais já o diziam assim…
- Se vamos ao campo e traduzimos o enlevo pela natureza em palavras como “árvore, riacho, flor, borboleta, ponte, açude, levada, casa, dia de sol, cair da tarde”, talqualmente os nossos antepassados diziam…
- Se nós a quem amamos traduzimos o amor com palavras iguais à dos nossos avitos…
- Se sofremos a dor e a exprimimos com os mesmos termos que outros, antes de nós, empregaram;

é claro que entre nós e os que nos precederam e os que nos continuam para o futuro há algo de unitivo, algo de comum - é a PÁTRIA que se corporiza nas palavras da mesma Língua!

Por isso:

LÍNGUA É PÁTRIA e PÁTRIA É LÍNGUA!

Língua e Pátria, Pensamento e Palavra, Palavra e Vida - tudo é uma e a mesma coisa.

Nenhum português ignora haver a Espanha dominado Portugal desde 1580 e 1640.
Durante esse período de opressão, o Estado era espanhol, nas houve um símbolo da nossa Pátria que ficou inviolável - a Língua Portuguesa!
Além das características étnicas propriamente ditas, além do sentimento patriótico, nada tínhamos de independente, nem sequer a literatura!
Todavia, tais características e tal sentimento conseguiram manter uma expressão real e intangível… algo os uniu - a LÍNGUA PORTUGUESA, realidade indomável da nossa Pátria!

E esta união manteve-se…
… e a oceanicidade de Portugal continuou a obra começada na Lusitânia!

Nos longes do tempo e do espaço, isto é, na sua lenta formação pré-histórica e, portanto, na alma do Povo da Lusitânia, na PERSONALIDADE portuguesa, na amplitude idiomática, no esplendor literário, na expansão pelos mais dispartidos climas, esta é ,verdadeiramente…

… A DITOSA LÍNGUA NOSSA AMADA!


Carlos Fiúza

Anónimo disse...

Eu bem queria aqui exercer o contraditório!Contra JAM?Contra CF?
Sim. Mas como? Sei que tudo tem contraditório.Só que nuns casos é mais difícil que noutros.Por excelência vossa e por insuficiência minha, limito-me a declarar aqui a minha respeitosa admiração.
JLM

Anónimo disse...

Caríssimo Carlos Fiúza (C.F.),

Ah,!... Afinal a gente do Povo também sabe discernir o que lhe vai na “Alma”. O vosso texto é, na verdade, eloquente. Parabéns, por isso, meu caro. Fala da Língua Portuguesa como uma “seara”. Que coisa mais bela, belíssima e sumptuosa. Nós, os da “arraia-miúda”, como disse Fernão Lopes, apesar de não passarmos de simples “obreiros”, também a sabemos esulpir sem utilizar o escopro e o cinzel, mas sim, a "pena" para lhe dar: forma, conteúdo, substância, movimento, ritmo e, por fim, beleza e… o que quiser. É com contributos como o seu que esta pureza cristalina se consubstancia.

Mas, o meu caro e ilustre concidadão, foi mais além. Faltou pouco para atingir o clímax! Esteve muito próximo do sentido patriótico que nos caracteriza além fronteiras. Foi um grande obreiro. Referiu que, cito, “LÍNGUA É PÁTRIA e PÁTRIA É LÍNGUA!”. É, isso aí, como dizem os nossos patrícios brasileiros que falam o português doce. Mas, confesso galgou a fronteira. Referiu que a Língua Portuguesa é conceito de “oceanicidade de Portugal”. Pois é. Refere, ainda que o “Povo da Lusitânia, emana a sua PERSONALIDADE desta ambiência georeferencial a que o nobre escritor/poeta denominou de “ditosa Pátria”. Daí que, termina o seu nobre texto desta incomensurável forma: “… A DITOSA LÍNGUA NOSSA AMADA!”. Bem hajas!

Por fim, caro J.L.M., como vê, é assim que este ilustre povo carrazedense trabalha. Somos pobres, é verdade; mas ricos na cultura que os nossos antepassados nos legaram. Apesar de, em certos momentos, não compreender o seu contraditório, como vê, por bem simples que seja a reflexão é sempre bem-vinda, quando ela vem por bem e trás no ventre algo de substância para saciar o nosso ego.

Respeitosos cumprimentos

LVS