Eis um problema de linguagem aparentemente
simples, mas, na realidade, muito complexo:
O cão é um animal inteligente?
O mesmo se diz do cavalo ou do golfinho.
Para resolver este problema, temos de,
previamente, fixar a aceção em que se emprega a palavra inteligente, quando a aplicamos aos animais, e quando a
aplicamos ao homem.
Isto é,
Será inteligência
uma faculdade exclusiva da atividade mental do homem, ou capacidade extensiva à
atividade cerebral de animais como o cão, o cavalo, etc.?
Tudo isto depende do significado que se atribui
à palavra inteligência.
Ora vejamos:
-
Inteligência, segundo a etimologia, é “faculdade ou
capacidade de recolher ou trazer alguma coisa ao conhecimento”, pois assenta
em inter +
lego (isto é, recolher).
-
Inteligência pode, ainda, ser a “elementar perceção pelos sentidos”.
Como se sabe, chama-se, em Filosofia, perceção ao conhecimento dos objetos.
Se pelos sentidos, a perceção é sensível. Se pelo entendimento, Intelectual.
Segundo dizem os homens, a perceção intelectual é defesa aos animais;
pelo menos estes não conhecem abstrações.
A inteligência,
considerada como operação do entendimento, não se atribui, filosoficamente, aos
animais "irracionais".
Ponhamos este problema:
Um gato escalda-se um dia em água fervente. Esse
gato capta, pelo sentido, o conhecimento de que, se mexer outra vez na água
quente, se queima. Ora, o gato pode, pelo facto, distinguir a água fria da água
quente. Mas ele não se entrega a distinções de atividade mental deliberada. Por
isso, "gato escaldado de água fria tem medo".
Tem prudência o bichano, mas é prudência instintiva.
Procede o gato com "inteligência"
quando evita a água quente, com medo de se queimar novamente?
1.
Procede com "inteligência" se por esta palavra quisermos apenas dizer que
ele possui uma acusação sensorial,
que o guia no evitar a água depois de se queimar.
2.
Não procede com "inteligência", se
afirmarmos que inteligência
é faculdade de discernir, porque o gato, embora por uma reação relacionada com
a impressão recebida, proceda diferentemente com água quente ou fria, não sabe,
no entanto, discernir,
ou distinguir mentalmente as relações da água
em cada um dos estados de temperatura.
A Inteligência,
no filosófico sentido transcendente de faculdade ou capacidade de apreender as relações das coisas, associa-se, no homem, a
outras atividades, tais como a vontade,
o juízo.
Nos animais, não. O animal guia-se, unicamente,
pelas sensações, pelos apetites e pelo instinto.
Atos de "inteligência" propriamente ditos
(como abstrair e julgar) são privilégio dos
homens, e os animais estão privados de tais faculdades.
Nestas condições, se aplicássemos
"inteligência" apenas no sentido de Inteleção (palavra que, na terminologia filosófica, exprime
a inteligência
propriamente dita); nesse caso, não poderíamos dizer que o cão ou o cavalo são
animais "inteligentes".
Mas, quando falamos assim, empregamos o termo
"inteligente" no intento de traduzir o maior ou menor grau de tino que os animais revelam.
Isto quer dizer que, fazendo-se descer a palavra
"inteligência" do alto lugar de inteleção ao grau inferior de tino ou instinto, nada impede que chamemos "inteligente"
a algum animal.
É o que acontece quando observamos um cão e um
condutor de automóvel... (dá que pensar na chamada "inteligência" dos
animais quando comparada ao fraco “tino” que alguns homens mostram por vezes).
Vejamos:
O automóvel vinha em carreira desapoderada, e um
cão, em andamento normal, atravessava a rua.
Se o indivíduo guiador do carro não matou o
animal, foi porque este, depois de se ter postado em frente do carro, correu à
direita e correu à esquerda, conseguindo safar-se, não por perícia do condutor,
mas por uma prodigiosa intuição (passe
o termo) de fuga do animal "irracional" para o lado menos perigoso.
(Na história da
Filosofia, fala-se muito de um burro que, cheio de fome, ao ver-se a igual
distância de dois fardos de palha, ficou parado, morrendo esfomeado por não ter a capacidade da escolha, o livre arbítrio, que o homem possui).
Em conclusão:
A inteligência,
no alto sentido de faculdade de abstrair,
de julgar, de raciocinar; a inteligência como capacidade de apreender relações é privilégio
dos homens.
- Inteleção
se chama ao ato da "inteligência"
propriamente dita.
Nesse rigorismo distintivo, teríamos de dizer
que um cão é "esperto",
e não "inteligente".
No entanto, a "esperteza" dos cães
pode chamar-se "inteligência", ampliando-se a palavra
"inteligente" no sentido etimológico de - captador pelos sentidos ou pelo instinto; dotado de tino e,
daí, podemos, afoitamente, empregar na linguagem comum a palavra "inteligente" no sentido de
"esperto".
Quem tiver junto de si o Dicionário de Aulet (o nosso
melhor dicionário semântico) pode ler:
"Inteligente"... que tem
inteligência: O homem é um ser inteligente. Também se diz dos irracionais com
respeito ao maior ou menor tino que
revelam”.
Em alta Filosofia, aos fenómenos da
representação espiritual, aos fenómenos cognitivos costuma dar-se o nome de
"pensamento".
Ora, apesar de o "pensamento" ser privilégio
humano, diz-se por aí que... a
pensar morreu um burro.
Por outro lado, apesar de os homens serem "inteligentes", eles ficam
todos contentes quando revelam... "esperteza de rato".
E posto que o homem negue ser parente do macaco,
é este bicho que lhe empresta a "esperteza"
maliciosa excecional, quando se diz - "Que grande macacão que ele me saiu".
Carlos Fiúza
3 comentários:
Caro CF
mais uma vez o saber simples do complicado
questão
que pensará o cão, o burro .. ou a amiba do homem? .. o que se considera a si mesmo o ... mais evoluido?
Recordo-me sempre de Dale Carnegie quando não discutia literatura e atá dava razão -.. com não percebia nada do assunto e justificava-se .. para quê .. criar um inimigo??
Quem definiu que na Natureza tudo é irracional?.. Só o Homem é que é racional..
Logo .. o Homem não é natural.. ou .. não faz parte da natureza
.. cump
mc
Outro belo texto com um jogo subtil de palavras e sentidos.É muito difícil chegar à profundidade da sua dissertação. Estou é admirado que MC considere tudo redutível à natureza. Esqueceu-se de dizer,como crente, que a natureza foi formada por Deus.Facto este irrelevante se nós,homens,estivermos sujeitos a todas as leis da natureza.Neste caso, cada animal terá os dotes necessários à sua existência. Chamarmos-lhe uma coisa ou outra dependerá daquilo que a ciência vier a demonstrar.
JLM
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podemos não mudar o mundo mas.. fazemos por isso e evitamos que piore
Tanta estupidez .. somos superiores..somos os mais mais inteligentes .. somos os unicos racionais.. porque na natureza tudo é irracional ... mas .. QUEM ESCREVE ISTO ?... o único aborto que por ser diferente ... NÃO FAZ PARTE DA NATUREZA!!!!!
todos os seres, de acordo com a natureza, não compreendem nem o homem .. nem o o Deus que eles dizem ter...........
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