25 maio 2013

INTELIGÊNCIA E INSTINTO, ESPERTEZA E TINO: Carlos Fiúza



 Eis um problema de linguagem aparentemente simples, mas, na realidade, muito complexo:
O cão é um animal inteligente?
O mesmo se diz do cavalo ou do golfinho.

Para resolver este problema, temos de, previamente, fixar a aceção em que se emprega a palavra inteligente, quando a aplicamos aos animais, e quando a aplicamos ao homem.
Isto é,
Será inteligência uma faculdade exclusiva da atividade mental do homem, ou capacidade extensiva à atividade cerebral de animais como o cão, o cavalo, etc.?
Tudo isto depende do significado que se atribui à palavra inteligência.
Ora vejamos:
- Inteligência, segundo a etimologia, é “faculdade ou capacidade de recolher ou trazer alguma coisa ao conhecimento”, pois assenta em inter + lego (isto é, recolher).
- Inteligência pode, ainda, ser a “elementar perceção pelos sentidos”.

Como se sabe, chama-se, em Filosofia, perceção ao conhecimento dos objetos.
Se pelos sentidos, a perceção é sensível. Se pelo entendimento, Intelectual.
Segundo dizem os homens, a perceção intelectual é defesa aos animais; pelo menos estes não conhecem abstrações.
A inteligência, considerada como operação do entendimento, não se atribui, filosoficamente, aos animais "irracionais".
Ponhamos este problema:
Um gato escalda-se um dia em água fervente. Esse gato capta, pelo sentido, o conhecimento de que, se mexer outra vez na água quente, se queima. Ora, o gato pode, pelo facto, distinguir a água fria da água quente. Mas ele não se entrega a distinções de atividade mental deliberada. Por isso, "gato escaldado de água fria tem medo".
Tem prudência o bichano, mas é prudência instintiva.
Procede o gato com "inteligência" quando evita a água quente, com medo de se queimar novamente?

1.        Procede com "inteligência" se por esta palavra quisermos apenas dizer que ele possui uma acusação sensorial, que o guia no evitar a água depois de se queimar.
2.        Não procede com "inteligência", se afirmarmos que inteligência é faculdade de discernir, porque o gato, embora por uma reação relacionada com a impressão recebida, proceda diferentemente com água quente ou fria, não sabe, no entanto, discernir, ou distinguir mentalmente as relações da água em cada um dos estados de temperatura.
A Inteligência, no filosófico sentido transcendente de faculdade ou capacidade de apreender as relações das coisas, associa-se, no homem, a outras atividades, tais como a vontade, o juízo.
Nos animais, não. O animal guia-se, unicamente, pelas sensações, pelos apetites e pelo instinto.
Atos de "inteligência" propriamente ditos (como abstrair e julgar) são privilégio dos homens, e os animais estão privados de tais faculdades.
Nestas condições, se aplicássemos "inteligência" apenas no sentido de Inteleção (palavra que, na terminologia filosófica, exprime a inteligência propriamente dita); nesse caso, não poderíamos dizer que o cão ou o cavalo são animais "inteligentes".
Mas, quando falamos assim, empregamos o termo "inteligente" no intento de traduzir o maior ou menor grau de tino que os animais revelam.
Isto quer dizer que, fazendo-se descer a palavra "inteligência" do alto lugar de inteleção ao grau inferior de tino ou instinto, nada impede que chamemos "inteligente" a algum animal.
É o que acontece quando observamos um cão e um condutor de automóvel... (dá que pensar na chamada "inteligência" dos animais quando comparada ao fraco “tino” que alguns homens mostram por vezes).
Vejamos:
O automóvel vinha em carreira desapoderada, e um cão, em andamento normal, atravessava a rua.
Se o indivíduo guiador do carro não matou o animal, foi porque este, depois de se ter postado em frente do carro, correu à direita e correu à esquerda, conseguindo safar-se, não por perícia do condutor, mas por uma prodigiosa intuição (passe o termo) de fuga do animal "irracional" para o lado menos perigoso.
(Na história da Filosofia, fala-se muito de um burro que, cheio de fome, ao ver-se a igual distância de dois fardos de palha, ficou parado, morrendo esfomeado por não ter a capacidade da escolha, o livre arbítrio, que o homem possui).
Em conclusão:
A inteligência, no alto sentido de faculdade de abstrair, de julgar, de raciocinar; a inteligência como capacidade de apreender relações é privilégio dos homens.

- Inteleção se chama ao ato da "inteligência" propriamente dita.

Nesse rigorismo distintivo, teríamos de dizer que um cão é "esperto", e não "inteligente".
No entanto, a "esperteza" dos cães pode chamar-se "inteligência", ampliando-se a palavra "inteligente" no sentido etimológico de - captador pelos sentidos ou pelo instinto; dotado de tino e, daí, podemos, afoitamente, empregar na linguagem comum a palavra "inteligente" no sentido de "esperto".

Quem tiver junto de si o Dicionário de Aulet (o nosso melhor dicionário semântico) pode ler:
"Inteligente"... que tem inteligência: O homem é um ser inteligente. Também se diz dos irracionais com respeito ao maior ou menor tino que revelam”.

Em alta Filosofia, aos fenómenos da representação espiritual, aos fenómenos cognitivos costuma dar-se o nome de "pensamento".
Ora, apesar de o "pensamento" ser privilégio humano, diz-se por aí que... a pensar morreu um burro.
Por outro lado, apesar de os homens serem "inteligentes", eles ficam todos contentes quando revelam... "esperteza de rato".

E posto que o homem negue ser parente do macaco, é este bicho que lhe empresta a "esperteza" maliciosa excecional, quando se diz - "Que grande macacão que ele me saiu".

Carlos Fiúza

3 comentários:

mc disse...

Caro CF

mais uma vez o saber simples do complicado

questão

que pensará o cão, o burro .. ou a amiba do homem? .. o que se considera a si mesmo o ... mais evoluido?

Recordo-me sempre de Dale Carnegie quando não discutia literatura e atá dava razão -.. com não percebia nada do assunto e justificava-se .. para quê .. criar um inimigo??

Quem definiu que na Natureza tudo é irracional?.. Só o Homem é que é racional..

Logo .. o Homem não é natural.. ou .. não faz parte da natureza

.. cump

mc

Anónimo disse...

Outro belo texto com um jogo subtil de palavras e sentidos.É muito difícil chegar à profundidade da sua dissertação. Estou é admirado que MC considere tudo redutível à natureza. Esqueceu-se de dizer,como crente, que a natureza foi formada por Deus.Facto este irrelevante se nós,homens,estivermos sujeitos a todas as leis da natureza.Neste caso, cada animal terá os dotes necessários à sua existência. Chamarmos-lhe uma coisa ou outra dependerá daquilo que a ciência vier a demonstrar.
JLM

mc disse...


https://www.facebook.com/photo.php?v=174099306083414&set=vb.219917808129521&type=2&theater

podemos não mudar o mundo mas.. fazemos por isso e evitamos que piore


Tanta estupidez .. somos superiores..somos os mais mais inteligentes .. somos os unicos racionais.. porque na natureza tudo é irracional ... mas .. QUEM ESCREVE ISTO ?... o único aborto que por ser diferente ... NÃO FAZ PARTE DA NATUREZA!!!!!
todos os seres, de acordo com a natureza, não compreendem nem o homem .. nem o o Deus que eles dizem ter...........