26 julho 2006

Terra Queimada


Alguns historiadores defendem a tese que, a reconquista encetada a partir das Astúrias, optou por uma política de terra queimada do Nordeste Transmontano devido aos poucos meios que dispunham os monarcas leoneses de defender os territórios ocupados. Assim os territórios entretanto conquistados eram propositadamente deixados abandonados e despidos de quaisquer incentivos para serem objectos de cobiça e conquista pelas hostes inimigas. Esta política é comummente conhecida de “ermamento”. Apesar de algumas refutações entretanto surgidas e também de outros estudos que o confirmam , aceita-se que a região de Trás-os-Montes seria na sua quase totalidade um tampão despovoado para defesa das investidas islâmicas.
Bem recentemente, a visita a Bragança de Mário Lino, Ministro das Obras Públicas, veio de novo reavivar esta ideia, pois “o modelo de desenvolvimento do interior não é com pequenas aldeias e vilas, a tocar os sinos ao Domingo, com a sua igreja e o seu cemitério”. O governante preconizou assim a extinção das aldeias e das vilas do interior porque o “dinheiro não estica”. O Governo Português estará “possuído de uma obsessão”, isto é, na aposta no crescimento das cidades de média dimensão como Bragança, Mirandela e Macedo. O ministro, na sua douta sabedoria, acrescenta que a culpa é dos citadinos “que muito se ralam com o desaparecimento das aldeias”, porém “não vêm para cá”. Esclarece-nos ainda o distinto servidor da causa pública que “são as pessoas que não querem viver nestes sítios” por não terem acesso aos bens e serviços que dispõem noutros lugares. (ver Mensageiro de Bragança 13/07/2006). Não verá o experimentado governante que a aposta nos bens e serviços deverá numa fase inicial ser da responsabilidade do sector público com a criação de infra-estruturas, nomeadamente as estradas (tanta promessa) e isso tarda a concretizar-se na região. Os nordestinos conhecem e compreendem mal os investimentos realizados pelo Estado junto das grandes cidades no apoio s à criação de emprego que se cifram em milhões de euros em detrimento de regiões deprimidas como a nossa em que aquele é contado aos tostões.
Esta filosofia pouco eco teve por estas bandas e quase ninguém refutou a doutrina do governante, talvez por a considerar verdadeira, inevitável e única. O modelo de desenvolvimento do interior preconizado não é novo, inicia-se na década de oitenta e tem como teorizador, entre outros, o ex-ministro Valente de Oliveira. Porém é insuficiente e castrador. Toda a praxis política dos últimos trinta anos tem apontado na criação de cidades de média dimensão com os resultados visíveis e profundamente insatisfatórias. A região tem um rendimento per capita dos mais baixos do país e regista os piores índices de desenvolvimento. As cidades como Bragança e Mirandela têm aumentado a população de uma forma artificial à base do incremento do sector de serviços (mais de um terço dos empregos da cidade de Bragança pertencem ao funcionalismo público), sem se basear num desenvolvimento económico sólido e sustentado.
As cidades para se desenvolverem necessitam de um suporte económico para além dos serviços, que na região passam essencialmente pela pequena indústria e, primordialmente, pela agricultura e turismo. Para isso é necessária a continuação de alguns núcleos habitacionais rurais e de vilas pujantes que sirvam de apoio às actividades económicas e ao crescimento. Não defendemos a manutenção artificial de todos os aglomerados populacionaiss e quiçá será necessário agregar alguns concelhos, porém é preciso apostar definitivamente, enquanto é tempo, em algumas aldeias e vilas. Não só por uma questão de sobrevivência humana nos espaços do interior, mas também para o desenvolvimento harmonioso e total do país.
Os primeiros reis, ultrapassada a questão da conquista das terras ao Islão, souberam com arte proceder ao povoamento e desenvolvimento do País, concedendo vários privilégios aos seus habitantes, transferindo-lhes poderes de autonomia, executando uma política de discriminação positiva. Sabemos que a história raramente se repete, mas é com o seu estudo e ouvindo o seu conselho avisado que aprendemos a projectar o futuro e a evitar erros do passado.

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