15 fevereiro 2006

O Quinto Império em Agostinho da Silva

Agostinho da Silva inspira-se na profecia das três idades de Joaquim Fiore, abade cisterciense, na Calábria (1187-1202) para teorizar o seu pensamento apocalíptico e defender o espírito ecuménico português para a edificação de uma idade virtuosa. Será clarificador explicar a teoria do “bom abade Joaquim”. Joaquim de Flora e particularmente os seus seguidores, “os espirituais”, divulgaram a doutrina de que todas as coisas eram dividas em tríades a partir da Trindade Divina e a própria evolução humana levaria à constituição da utopia - uma sociedade perfeita.
A primeira tríade era a dos homens, divididos em três classes: casados vivendo sob o Pai; clérigos cujo patrono era o Filho; e os mais venturosos e perto da perfeição seriam os monges que viveriam sob o Espírito Santo. A segunda tríade era a das doutrinas dividia-se em três épocas: a Primeira idade foi a do Pai que corresponderia à do Antigo Testamento caracterizada pelo temor a Deus e tempo dos patriarcas; a segunda foi a do Filho correspondendo ao Novo Testamento e caracterizada pela evangelização e pelos sacerdotes; a terceira e última época será a do Espírito Santo ou Paracleto, caracterizada pelo domínio do espírito em que os homens se amarão e viverão em perfeita harmonia governados por um Papa Angélico ou um Imperador Virtuoso, a seguir virá o fim dos tempos com a última vinda de Jesus Cristo. Nesta teoria do Joaquimismo haverá ainda uma terceira tríade que corresponde à maneira individual de viver: os que vivem sobre a Carne, vivem sob o Pai; sob o Filho vivem a um tempo sob a carne e o espírito; os que vivem apenas sob o espírito estão sob a influência do Espírito Santo; nesta linguagem metafórica entenda-se a carne os prazeres do mundo e o espírito será a entrega total a Deus.
Os descobrimentos portugueses seriam a tentativa de realizar na terra esta terceira idade sob a celebração do Espírito Santo.
Agostinho da Silva transporta esta tese para os tempos actuais e dirá “estamos no limiar daquela idade de que profetizou o bom abade Joaquim”. O culto popular do Espírito Santo nos Açores, Tomar e Sintra são a prova de que há vontade, no mínimo inconsciente de aspirar a esta utopia. Nos Açores é instalada uma criança como Imperador do Mundo. A criança pura, sem o estigma da escola, representa o modelo do homem a que se aspira, então está aqui o padrão daquilo que se deve fazer – “eles só coravam “imperador do mundo aqueles que tinham escapado à educação”. É também partindo daqui que se deve entender a tentativa de Agostinho da Silva, sempre muito vaga, por vezes contraditória e, no mínimo polémica, de reformar a pedagogia e a escola portuguesa. “A educação não terá nenhuma outra tarefa senão a de deixar que a bondade inicial esplenda e seja” está eleito o ponto de partida para a construção de uma sociedade melhor.

1 comentário:

Hélder Rodrigues disse...

A penúltima frase deste texto sintetiza, e muito bem, toda a teoria Agostiniana, como sendo contraditória e, por isso, polémica. Mas, para além de um homem extraodinariamente inteligente,Agostinho era também considerado um anti-institucional (nem sequer usava bilhete de identidade!), um visionário dado à premonição, de tal modo, que muito do que ele disse, e escreveu, mantém-se muito actual. A título de exemplo, registe-se o facto de, há algumas décadas atrás, numa entrevista concedida a um conhecido jornalista, lhe garantiu, grosso modo, que Portugal teria que entrar para a Comunidade Europeia; que o desemprego iria aumentar substancialmente devido a graves crises económicas e que o terrorismo internacional seria uma catástrofe por causa do fanatismo religioso.
Agostinho da Silva, que eu muito admiro e tenho até acompanhado algumas das reflexões que nos legou, deixou-nos um tríptico teórico assaz curioso, a que ele chamou de "teoria dos três esses", para o "bicho" Homem:
1º esse: - Sustento
2º esse - Sabedoria
3º esse - Saúde

É, pois, muito oportuno este texto do amigo Zé Mesquita, na altura em que se celebra o centésimo aniversário do nascimento de Agostinho da Silva!

mota