25 dezembro 2004

Carta ao Menino Jesus

Meu Menino Jesus:

É a primeira vez que te escrevo, por isso desculpa-me a informalidade e o atrevimento. Sei que agora é mais usual dirigir-se ao Pai Natal, pois houve necessidade de globalizar o receptor das preces para gáudio e benefício dos sentimentos consumistas. O senhor de barbas e natural da Lapónia, quiçá mais risonho e simpático, menos sagrado e agnóstico, possuidor de uma grande fábrica de brinquedos, com um complexo e organizado sistema de transportes, ajusta-se melhor ao espírito economicista da actualidade. Eu prefiro dirigir-me a ti por toda o sentido que representavas, apesar da mão cheia de nada que recebia em cada Natal de criança. Agradecia-te as batatas e o bacalhau regadas pela alegria da confraternização familiar. No elaborado presépio da nossa Igreja e à Tua volta se construía um mundo perfeito de simplicidade, ternura e harmonia. Quem precisava de brinquedos e outras coisas fúteis se qualquer instrumento natural era suficiente para povoar o nosso mundo de sonhos: as pedras, a terra, um pau, as árvores, um animal doméstico. Nada precisava pedir-te, já que de nada pensava precisar.

Agora é diferente e embora não crente, penso que sem a tua ajuda há coisas que nunca vão realizar-se. O primeiro pedido é se podes estancar a contínua saída de gente da nossa terra. A população jovem não encontra razões para ficar e busca, com razão, outros locais para se realizar. Algo deveria ser feito. Imploro que ilumines os nossos governantes a encontrar soluções. Suplico-te ainda que ajudes também ao nosso discernimento e imaginação de modo a sabermos correr riscos para encontrarmos soluções no sentido do progresso da nossa terra.

O segundo pedido é que nos ajudes a conservar as coisas boas que possuímos e que por força da estandardização e da falsa modernidade podemos perder. São elas o espírito comunitário, de sabermos que temos ao pé de nós alguém que podemos contar para a alegria e a adversidade, de continuarmos a ser uma grande família, apesar de alguns arrufos; a sensação ainda bem grande de segurança dos bens pessoais e patrimoniais; o sentimento de tertúlia que perpassa nas reuniões de amigos para o desporto, para as merendas ou tão só no café, bar ou associação…

O terceiro pedido é para o meu país. Vivemos numa encruzilhada e não se vislumbra uma solução para os grandes dificuldades que temos de enfrentar, Faz com que os nossos políticos pensem mais na resolução dos problemas que nos afligem do que em satisfazerem as clientelas partidárias. Que o mérito e o profissionalismo se sobreponham à cunha e ao compadrio. Que a justiça fiscal seja uma realidade, a distribuição da riqueza se faça de forma mais equitativa e a solidariedade não seja palavra vã. Ajuda-nos a descobrir o trilho do progresso e a preservar e consolidar uma identidade secular que, penso ter valido a pena.

Por último, deixa-me ser um pouco egoísta, é um pedido quase impossível, mas faz o meu Benfica campeão. Seria uma festa como nunca se viu no nosso país e elevaria o “ego” da maioria dos portugueses. O FCP tem já títulos que cheguem. O SCP pode esperar mais um ano. Seria bonito!

Não esqueças o trivial; a saúde e a paz para todos.

Saudações natalícias.

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