02 setembro 2004

Imperdoável

No interior do país vive-se habitualmente com muitos condicionalismos que são de todos conhecidos decorrentes de um baixo desenvolvimento humano, condicionado pela escassez de recursos e não satisfação de algumas necessidades básicas. O desenvolvimento do poder local e a mudança das mentalidades que o 25 de Abril proporcionou, potenciado com a entrada na Comunidade Europeia, trouxe às zonas do interior electricidade, mais asfalto, abastecimento de água, saneamento, muitos jipes e também a descaracterização urbanística, ambiental e a desertificação humana. A avaliação do progresso humano está directamente relacionado como diz a ONU com factores como a liberdade, a dignidade e a intervenção humana. A recente chegada da ADSL (a rede larga da Internet) foi um desses acontecimentos que contribui para nos tornar mais dignos e livres. O não acesso as múltiplas formas culturais, como o cinema e o teatro limita-nos, sobremaneira, no índice de desenvolvimento, assim como a diminuta oferta de actividades recreativas e lazer.
Nesta vertente, muitos procuram o litoral em tempos de férias. Nos últimos tempos assiste-se a um movimento contrário que as localidades interiorizadas teimam em não aproveitar completamente. São escassos no sul do distrito de Bragança, as unidades de turismo rural. O Douro aqui tão perto serve apenas para ver passar os barcos (já são muitos!) e acenar de longe aos turistas na ausência de políticas locais e regionais estruturadas e sistematizadas para aproveitar o filão. Sobram as dádivas da paisagem natural e humana que não são rentabilizadas.
No concelho de Carrazeda de Ansiães, para a fruição dos tempos livres dos locais construiu-se uma piscina municipal, posicionada numa belíssima zona envolvente arborizada e com parque de merendas. Na altura da canícula, três meses apenas (nove meses de Inverno e três de Inferno), acorrem às águas da banheira pública milhares de pessoas. Ela é a alegria das crianças e instrumento fundamental da sua socialização. Aí se iniciam amizades com outros jovens oriundos de comunidades de emigrantes com raízes familiares. Alguns que vivem na urbe projectam alguns dias para vir ao rincão natal também a contar com alguns mergulhos. Há ainda uns poucos forasteiros que tem já por hábito subir as montanhas, espraiar o olhar pela largura da paisagem, respirar ar puro e vir a banhos, aqui gozam total ou parcialmente os dias de descanso. Porém, este ano, metade do Verão passado, não há maneira de abrir a piscina municipal.
A razão é simples. O município iniciou por alturas da habitual abertura obras de manutenção que se arrastam sem fim à vista. As datas previstas para a sua finalização são proteladas continuamente e já ninguém acredita que acabem dentro da chamada época balnear. Este facto é elucidativo de uma má planificação de trabalhos e demonstra, no mínimo irresponsabilidade do poder autárquico. O senhor presidente da Câmara Municipal local já veio reconhecer o erro e assume total imputação. Pouco nos serve a nobreza do acto e a suposta coragem manifestada. Há um bem que contribui para o nosso indicie de desenvolvimento humano que não é possível ter e desfrutar.
Ficam as sequelas de um acto de gestão irreflectido e danoso para o município. Às crianças é difícil explicar-lhes as razões e arranjar-lhes alternativas de lazer porque elas não existem, os que têm possibilidades económicas largam e buscam locais alternativos, aos forasteiros desconhecedores da realidade e apanhados desprevenidos sorriem, abanam a cabeça e prometem não voltar. Acreditem que no Verão, sem piscina é mais deprimente viver neste interior. Imperdoável!

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