A Feira do Livro em Carrazeda de
Ansiães vai na XVII edição. É uma iniciativa louvável que se repete há muitos
anos e tem constituído uma “pedrada no charco” do panorama cultural concelhio.
A realização do evento tem sido justificação para a realização de diversas
actividades de índole cultural (...)
Tem também servido para, de uma
penada, comemorar os dois feriados: o 25 de Abril e o 1.º de Maio.
Até há bem pouco tempo, o dia da
Liberdade esteve presente com diversas iniciativas que passavam por sessões
solenes, sessões de esclarecimento, exposições, recitais de poesia… imitando-se
o que decorre um pouco com as fastidiosas, enfadonhas, mesmo “chatas” comemorações
nacionais. Actos que tornaram o dia aborrecido, monótono e depreciaram o
verdadeiro sentido da sua comemoração.
Presentemente questiona-se a
razão do festejo (...) Argumentos não faltam.
Aos jovens nada dirá porque a falta de liberdade e o condicionalismo do
pensamento e da acção não é compreensível em tempos de fruição democrática e
permissividade total, pois tudo é possível fazer sem qualquer empecilho. À
demais população, para além de uma pequena minoria, não aportará qualquer
sentido, já que o acontecido perde-se na bruma da memória e é mais um feriado
para desfrutar (...)
Mais, o evento pertencerá aos
anais da história. Com ou sem esse acontecimento, Portugal libertar-se-ia dos
condicionalismos do Estado Novo e actualmente viveria um período igual de
vivência democrática e integrado na comunidade de povos mais desenvolvido do
mundo. O período revolucionário em curso (PREC) que se seguiu, só nos fez
perder tempo e gastar energias escusadas. O processo atabalhoado da
descolonização criou feridas que custam a sarar e custaram vidas e
subdesenvolvimento às antigas colónias.
Porém,
um país sem memória, nem
história, é um país virtual. O 25 de Abril revelou-se um período único na
história recente do nosso país e que corresponde à aprendizagem do significado
da liberdade. Para os jovens de hoje será talvez difícil imaginar o que era
viver neste Portugal de há mais de trinta anos, onde era rara a família que não
tinha alguém a combater em África, o serviço militar durava quatro ou mais
anos, a expressão pública de opiniões contra o regime e contra a guerra era
severamente reprimida pelos aparelhos censório e policial, os partidos e
movimentos políticos encontravam-se proibidos, os presos políticos e de opinião
eram às centenas, os líderes oposicionistas encontravam-se exilados, a greve
interdita, o despedimento facilitado, a vida cultural apertadamente vigiada e
condicionada pela censura.
De um momento para o outro, qual
passarinho libertado da gaiola, cremos que era possível construir uma sociedade
utópica, despida de preconceitos, mais plural, justa e fraterna. Para quem o
viveu foram períodos intensos de aprendizagem da democracia e de participação
popular. O processo de descolonização comparado com o das grandes potências não
nos envergonha. Soubemos integrar centenas de milhar de compatriotas sem
grandes traumas e crises sociais. Tirados os devidos exageros, sobrou um país
mais desenvolvido.
Uma das expressões que eu
considero mais emblemáticas e brilhantes e que resumem o sentimento que uniu a
quase totalidade dos portugueses é esta – “a poesia saiu à rua”. Foi um período
de excessos, mas tremendamente significativo para a nossa afirmação como povo
“que parte à conquista do pão e da paz”. O 25 de Abril colocou-nos na certeza
de que “não voltaremos atrás”.
Por isso e por muito mais é
necessário comemorar o 25 de Abril e recriar os seus festejos de forma
inovadora para que nunca mais se esqueça e com eles os valores mais altos do
homem – a liberdade, a solidariedade, a paz. A comemoração do 25 de Abril deverá ser acima
de tudo uma festa popular, agora já sem qualquer constrangimento político, pois
são passados mais de trinta anos. Deverá sair do salão dos Bombeiros
Voluntários ou do Salão Nobre da Câmara Municipal e vir para a rua, para a
escola, ser de usufruto colectivo, de modo a aprendermos ou reaprendermos a
viver em liberdade, solidariamente e de modo fraterno.
2 comentários:
se o sonho comanda a vida , quem não sonha não vive!
O 25 de Abril fez-nos sonhar e muitos abrileiros, oportunistas e sem escrupulos , roubaram-nos o sonho e destruiram a nossa vida.
mario carvalho
abraço ao Zé Mesquita e a todos os bem intencionados de Abril
Para que algo permaneça é necessário que se renove e se sublime na essência mais pura, que constituirá o fator de união dos diversos modos de atuar.
Acreditemos que todos nós temos sentimentos nobres, que, por todos, podem ser comungados.
E quais serão esses sentimentos?
Deixai-me tentar resumir quais eles sejam: a liberdade, a fraternidade, a responsabilidade.
Queremo-nos todos livres, fraternos e responsáveis.
Esta a essência da união.
O modo de chegar ficará ao critério de cada um.
Mas, como tudo o que é humano, não é um dado adquirido para todo o sempre. Deve antes ser construído mais e mais ano após ano.
Querem que seja isto o espírito do 25 de Abril?
Se querem, mãos à obra.
JLM
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