A teoria providencialista acredita, pois, na fundação mítica
de Portugal: Túbal, neto de Noé, fundou Setúbal e os seus descendentes fundaram
o futuro reino. Porém, o maior mito presente na teoria é o viratiano que
pressupõe a origem exemplar face a inimigos poderosos. Surge pela primeira vez
no apelo espartano de Sá de Miranda para a preservação dos costumes, “Ouves
Viriato, o estrago/ que cá vai dos teus costumes” (Carta a António Pereira,
senhor do Basto, Quando se partiu para a Corte co`a Casa Toda); e continua em
Camões “… com Viriato na inimiga / Guerra Romana, tanto se afamaram” (I, 26), que
o considera o “patriarca militar dos portugueses” (Real 2011: 108) e como
refere Machado “graças à educação escolar, passou a pertencer ao imaginário de
todos os Portugueses.” (2010).
«O mito de Viriato insere-se na tradição de se acreditar que
há uma relação de continuidade entre os Portugueses e os Lusitanos. Estes são
considerados por etnólogos e historiadores um conjunto de povos mais ou menos
homogéneos na língua e nos costumes que habitavam uma grande parte do
território catual português quando os Romanos iniciaram a conquista da
Península.»
«Viriato já não é, como era há pouco mais de cem anos,
apanágio do conhecimento de alguns. Graças à educação escolar, passou a
pertencer ao imaginário de todos os Portugueses.” (Machado.2010)
A teoria providencialista completar-se-á com o milagre de
Ourique, que unge de sagrado o primeiro rei na forma da aparição divina e
predestina o país à glória futura.
O mito de Viriato viria a ser contestado, pela primeira vez
por Herculano que esclareceu que não havia qualquer prova documental do
relatado e tudo não passava de pura efabulação. (Matos 2002: 125) e atribuía a
independência às qualidades raras de estratega e coragem de D. Afonso
Henriques. O golpe final sobre esta efabulação é de Mattoso (2008: 44): o país
foi uma construção política e não teve qualquer génese natural, “Portugal não
se distingue do resto da Península Ibérica por nenhum elemento diferenciador de
caráter natural. O País foi uma construção de homens, e não da natureza.” A
divisão administrativa foi muito mais uma convenção política e física do que
pautada por traços de personalidade ou outros dos povoadores.
A enumeração dos feitos de Portugal circunscreve-se às
crónicas dos reis, à fundação de um mosteiro, ao milagre ou à vida de um santo.
Será na segunda metade do século XVI que surge a primeira obra em que o sujeito
são os portugueses, as Décadas de João de Barros. Contudo serão Os Lusíadas
a protagonizar os portugueses como povo designado e ungido pelo seu passado
glorioso e predestinado para grandes proezas.
O impacto da obra adquire uma tal grandeza que tem
alimentado muitos sonhos utópicos acerca do destino nacional até aos nossos
dias. A época das descobertas e da expansão portuguesa é sem dúvida a marca
indelével que define o conceito de identidade nacional. “Camões conferiu-nos,
coletivamente uma existência epopeica e desta insolação sublime nunca mais nos
curámos” (Lourenço 2010: 152) e é visível o impacto da obra na atualidade - “a
consciência nacional apareceu com um fulgor e uma presença que são ainda para
nós uma nostalgia” (Idem: 156).
Este sentimento glorioso e ímpar do período da expansão portuguesa
acordou na realidade crítica e de desilusão que se abriu aos nossos olhos no
período posterior e deu lugar a múltiplas expressões culturais: o saudosismo, o
sebastianismo, e o messianismo do v império, ou em movimentos como o
Integralismo Lusitano, a Renascença Portuguesa ou a Seara Nova.
(Portugal num mundo globalizado)
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