24 janeiro 2010

Os Tísicos de Eugênio de Castro

Continuando a presentear com poesia dos outros ocorreu-me transcrever o poema “ Sanatório dos Tísicos”. A intenção é tambem a de levar os mais saudosos do “criador”, quiçá os menos tísicos, a olharem á volta e regenerarem-se agora, ajudando os muito tísicos que encontram em seu redor, a recuperar a saúde.

OS TÍSICOS

Em Outubro. A serra é coberta de neve,
Cenograficamente branca...
Arquitecturas de prata e neve...
A serra é cenograficamente branca...

Brancura das donzelas amortalhadas,
Brancura de leite, brancura de hóstia,
Zaimph astral, toalhas de altar e véus de fadas...
Pureza de hóstia, brancura de hóstia...

Mas eis que vejo no femíneo colo
Da serra, clangorando com dureza,
Sangrentos tons de telha marselhesa:
- Incêndio ruivo no polo!

Ah! o rubor da serra branca e honesta,
Intenso como o rubor dos tísicos...
- Felizes tardes, santo pastor, que povoação é esta?
- É o Sanatório dos Tísicos.

Som de sineta. Eles lá vêm, bocas vermelhas como cactos,
Olhos profundos, ossos e peles...
Tão magros andam que os seus fatos
Dir-se-ia que não são deles.

Oh! essas calças vazias, essas mãos longas, sem pulsos,
E esses casacos, largos de mais, aflando à viração leve...
Há tempestades de tosse, e alguns escarram, convulsos,
Papoulas na pura neve.

Que pena causam as donzelas
Já no último grau, magrinhas e simpáticas!
Parecem flores de estimação! Passam regatas de estrelas
Em seus olhos, doces noites aquáticas.

Vede aquele tisicozinho, acariciando um cão,
E aquele velho mirrado, todo florido de junquilhos,
E aquela pobre irmã, acompanhando o irmão,
E aquelas mães atrás dos condenados filhos.

Não há espelhos na serra... Olhai aquela rapariga
Tísica, ao pé dum tísico, seu noivo...
Penteia os seus cabelos cor de estriga
Aos olhos claros do seu noivo!

E aquele camponês e aquele soldado conversando!
Vede este avô levando
Ao colo o neto, que é quase um homem!
Vede os mancebos imberbes, olhando, cheios de desejos
As virgens cujos olhos ardentes os consomem!
E aqueles noivos, quase moribundos, aos beijos!

E os tísicos, espiritualmente anestesiados,
Alegremente vão, dramáticas figuras,
Sonhando sonhos arco-irisados,
Noivados puros, beijos profanos, vilegiaturas...

Arquitectos febris de castelos no ar,
Não vendo a Morte, pastora má, que anda a guardá-los,
Eles lá vão, lá vão, a sonhar, a sonhar,
Julgando a vida um paraíso de regalos.

Crêem-se quase sãos, e vão pelas estradas,
Tão absortos nas suas infantis ilusões,
Que não ouvem as frias marteladas
Do carpinteiro que faz os mortuários caixões.

E lá vão, sob o sol, celibatário tísico,
A sonhar, a sonhar, como ingênuas crianças...
- Jesus! meu bom Jesus! dai-me que eu morra tísico,
Para que ainda uma vez torne a ter esperanças!

(Obras Competas de Eugênio de Castro - primeiro volume: Oaristos - Horas - Silva, Lisboa, A.M. Pereira Filho, 1968, Págs. 185-187).

11 comentários:

Anónimo disse...

e os independentes não dizem nada?

Anónimo disse...

Este Eugénio de Castro será familiar do poeta Eugénio de Andrade?? O estilo é muito parecido.

Helder Carvalho disse...

"E os tísicos espiritualmente anestesiados alegremente vão...( foram)...E AGORA ? JESUS MEU JESUS" salvai-nos.

Anónimo disse...

e os tisicos espiritualmente nao anestesiados que os seus entes mais proximos anestesiam para os tornarem tisicos para outros entes que sairam do seu colo???

Anónimo disse...

Este Eugénio de Catro e Almeida (porque é que não acrescentou o verdadeiro apelido? Pois, pois, a simbologia, não é? como eu o compreendo...), poeta dos finais do séc. XIX, ao lançar o seu "Oristos", pretendeu, quiçá, ser uma voz marcante do Simbolismo português, com forte influência nos Simbolistas franceses (que se opunham ao chamado Parnasianismo e Decadentismo caracterizados estilisticamente - se a memória dos meus tempos universitários de estudante de Cultura Francesa não me engana - por estruturas formais rígidas e fechadas...), Baudelaire, Verlaine e outros que tais. Parece-me evidente que HC, ao disponibilizar este poema simbolista, pretendeu fazê-lo, tal como o Simbolismo, em reacção ao decadentismo que caracterizou a governação concelhia de um tal E. de C. outro, que todos conhecemos... É isso?
Cordiais saudações.

h.r.

Anónimo disse...

SE FOSSEM SÓ OS "TÍSICOS", NÃO TENHO DÚVIDAS DE QUE A CURA ERA (É) POSSÍVEL. AGORA, A PATOLOGIA DESSES(?) TAIS É MUITO PROFUNDA!... . NÃO SEI, MAS POSSIVELMENTE, ESTARÁ PARA LÁ DO INFINITO, TAL FOI A BASE DO "DESPESISMO IGNÓBIL" QUE PROSSEGUIU E GERADOR DO MAL-ESTAR CAUSADO. NESTE CASO, SÓ ESPERO QUE ESSAS "METÁSTASES POLÍTICAS" NÃO PROLIFEREM MAIS, PARA BEM DE TODOS.

Anónimo disse...

ó senhor escultor, isso é ódio ou amor?

Anónimo disse...

Nem uma coisa nem outra; apenas DÓ !

Anónimo disse...

Os tísicos estão tão tísicos que até parecem mais tísicos ques os próprios tísicos...
Ass Tísico ao Quadrado

Anónimo disse...

Corre em Carrazeda um abaixo assinado, cuja ideia principal promete resolver o problema do cemitério novo: Este ficaria reservado para os cadáveres políticos que por cá andam, ou andaram e o outro, o cemitério velho, ficaria para o uso normal. Eu Assino!!

Anónimo disse...

Soube agro que vai ser feita uma corrida de toiros em portugal, mais precisamente em Vila Franca de Xira o que é curioso é que as receitas vão ser destinada á Liga Protetora dos Animais.
Curioso não?
Será que em Carrazeda não se lavam também as mãos com feitos identicos.