05 setembro 2005

Crendices e modernidade

Desde que o homem existe, se acredita que a vontade do divino serve para explicar terramotos, inundações, tufões, secas e outras calamidades que tais. Proliferam as explicações dos factos naturais pelo recurso ao sobrenatural e eles acontecem como fenómenos justificativos da ira de Deus que assim pretende castigar o pecado e a Sua desobediência.
Curioso é que, nos tempos modernos, as explicações do foro espiritual servem diversas crenças e justificam os pecados colectivos conforme o ângulo de análise.
Assim, a tragédia do Katrina para os evangélicos ultra-conservadores do sul da América é o castigo de Deus perante os pecados do aborto e da homossexualidade. Para os extremistas muçulmanos, este foi um castigo de Alá para a política americana da dita agressão ao mundo árabe. Até para os fundamentalistas judeus, este é um “juízo divino”, pois coincide com os últimos dias em que os colonos judeus foram desalojados das suas casas na faixa de Gaza.
Também uma nova casta de”religiosos”, muitos ambientalistas, vem para os órgãos de comunicação social atribuir as culpas da tragédia à potência mundial por ter sabotado o acordo internacional sobre emissões de gases e as obras efectuadas ao longo do Mississipi. Muitos destes rituais e discurso tem um paralelismo gritante nos grupos fundamentalistas religiosos. Como sejam, as acções folclóricas de rua e as dissertações inflexíveis.
A serenidade que devia presidir a uma explicação racional e científica para estas situações é toldada pelo radicalismo religioso. É pena que em tantos milhões de terrestres ainda façam eco estas afirmações e que muitas delas sirvam para a manipulação das opiniões públicas mundiais.
Quando está na calha a compra de um dos canais televisivos por uma “igreja”, a Maná, que usa deste tipo de artifícios para explicar os fenómenos naturais, convém que a sociedade reflicta sobre o assunto. O espaço radioeléctrico português, que é um bem público e carece da concessão de alvará por parte do Estado, não pode servir a potenciação da crendice e da superstição. O Governo que tem o dever de regular o mercado com base nas leis da concorrência não pode alhear-se dessa função que é obstar ao obscurantismo e à irracionalidade.

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