Há mais de 700 anos que se realiza feira no concelho. Das aldeias e dos outros concelhos acorriam milhares de camponeses. Só se deixava de ir à feira
em tempo de sementeira, ceifa, malhada, vindima e apanha da azeitona, porque
nestes trabalhos “sagrados”, nem a feira era mais importante. Ia-se cedo para
aproveitar bem a manhã, pois “os atrasados só encontram o rebusco”. A tarde era
para o desfrute: digerir a dobrada, beber uns “canecos” e desenferrujar a
língua. Sim, porque para muitos, dia de feira é dia de festa.
A
maior parte dos aldeãos desloca-se a pé, em carros de bois, cavalos ou mulas. Porque
é dia de feira, ajaezam as “crias” com os melhores arreios e sobre a albarda
ajeitam uma manta vermelha. Na cabeça dos bois, um braçado de feno para
remoerem na sombra dos cedros da entrada da vila ou nas giestas e mato que
envolve todo o povoado. Vai-se também à feira nas carrinhas de caixa aberta com capota no Inverno para
cortarem o frio e o vento gélido.
Dia
de feira era dia de negócios. Vai-se para encontrar quem compre ou venda o vinho,
a amêndoa, o cereal, a resina, o animal… No alforge vai a prova do
vinho para o taberneiro da vila apreciar e no pensamento, um bom negócio. Pela
estrada fora circula um par de leitões a passo lento e enervante, bem seguro
nas pernas por uma corda, para vender (um ou outro ficou na loja para criar
para a matança); alguém os há de comprar para “cevar” com os nabos, as couves e
as abóboras que se cultivam na courela, matar um para casa, e vender o outro
numa qualquer feira de inverno, com lucro certo. Nos carros de bois ou nas
carroças, o excedente das batatas, das hortas para fazer uns tostões. Alguns eram capazes de caminhar vários quilómetros para vender uma ou duas galinhas, ou
uma dúzia de ovos.
A
vila era invadida por uma multidão. Os pontos principais de reunião situavam-se no Largo do
Toural com a feira do gado e as tendas da roupa; e a praça D. Lopo com as barracas
dos produtos agrícolas, de quinquilharia e dos ourives… Tanto uma como outra
praça eram uma desordem organizada porque no meio da confusão todos sabiam onde
dirigir-se. Toda a vila mostrava uma contínua algazarra feita de animação, alegria,
rebuliço e ruído contagiosos. Prendiam-se as mulas, os machos e os cavalos à
porta dos tascos enquanto se “embarcavam” uns copos acondimentados com uma lasca
de bacalhau que se levava no bolso. Nas tabernas vendia-se
de tudo: camisas, tripas secas, bacalhau, toucinho, vinho… À hora do almoço
dava-se o bocado de feno ou a ração que a “cria” transportou e ia-se almoçar a
dobrada à pensão da Isaura. Pouco depois alguns regressavam com as compras. Muitos
ficavam para a tarde: destravavam a língua, bebiam uns copos e já alcoolizados
regressavam trôpegos ao cair da noite aos povoados, repletos de alvoroço e
recarregados para mais dez dias de trabalho de jorna.
(continua)
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