07 outubro 2004

O caso das condições específicas

Eis alguns passos do infeliz processo dos destacamentos por condições específicas nos concursos de docentes do presente ano lectivo:

1. Segundo a nova legislação (Decreto-Lei 35/2003), o destacamento por condições específicas (DCE) é um meio dos docentes terem prioridade na colocação, isto é, basta um atestado médico para ser colocado à frente de todos os outros em qualquer local do país. Por exemplo, se pertencer ao quadro de zona pedagógica dos Açores com este expediente pode ser colocado numa escola de Carrazeda de Ansiães em primazia sobre os outros que não metam atestado. O objectivo da lei reside na benesse de permitir a quem tem doença invalidante aproximar-se do local de residência.

2. As doenças são tipificadas em despacho a propósito e já foram enumeradas neste blog. Muitos dos atestados apresentados nos agrupamentos de escolas, pelo que a comunicação social referiu não se enquadram no conjunto de doenças do referido despacho, se assim for, o resultado será o de qualquer tipo de doença ter permitido o DCE.

3. Os atestados médicos apresentados ultrapassam os nove milhares cerca de 1/6 do total de candidatos. Em Vila Real e Viana do Castelo este valor subiu aos 80%. Em Bragança, cerca de 70% dos professores do 1.º Ciclo usaram este expediente. Das duas uma, ou houve um claro abuso de utilização ou nestes distritos grassou uma epidemia.

4. Situemo-nos em Bragança. Este distrito dispõe de um quadro de docentes no limite. Há muitos residentes que não conseguem entrar e estão colocados em outros, designadamente Viseu, Açores, Tâmega e outros. O DCE apareceu como tábua de salvação. Muitos agarraram-se a ela e assim obtiveram facilmente a colocação.

5. Mais de 200 professores do 1.º Ciclo do Ensino Básico de Bragança não obtiveram colocação, muitos com duas dezenas ou mais de serviço. Outros bem posicionados foram colocados a mais de 100 kms da residência. Outros ainda, verdadeiramente necessitados que conseguiam colocação perto de casa pelo destacamento referido foram parar bem longe.

6. No novo quadro legal de colocação de professores já referido é permitido aos docentes afectados a uma escola poderem ser reconduzidos por um período de três anos, o que se se provarem ilegalidades, acrescentará um ónus de injustiça verdadeiramente insuportável.

7. Em vários locais do país, muitos professores verdadeiramente indignados pela situação menos clara, exigiram a fiscalização rigorosa dos atestados médicos de modo a pôr cobro a graves injustiças, perante o silêncio dos sindicatos e a promessa do ministério de continuar a fiscalização.

8. Em Carrazeda, antes da saída das listas de graduação, todos os professores que se sentiram potencialmente lesados elaboraram uma exposição à ministra da educação e aos sindicatos no sentido de os alertar para as possíveis consequências de uma análise pouco rigorosa. Alertámos para o problema com cartas publicadas nos jornais Público, Correio da Manhã, Jornal de Notícias e ainda na revista Visão.

9. A grande trapalhada que envolveu os concursos no presente ano lectivo baixou a guarda de uma correcta avaliação desta problemática. O que interessava era pôr os professores na escola e neste caso do DCE, as piores consequências concretizaram-se. A quase totalidade dos pedidos de destacamento por condições específicas obteve colocação em detrimento de outros mais bem posicionados nas listas de graduação. Por cá apresentámos queixa com abaixo-assinados ao Presidente da República, ao Primeiro-Ministro, à Ministra da Educação, ao Provedor de Justiça, à Inspecção Geral de Ensino, aos Grupos Parlamentares da Assembleia da República, DREN, deputados da região e outros da Comissão da Educação. Apresentámos ainda individualmente uma queixa ao Provedor de Justiça e um recurso hierárquico ao ministério, no sentido de sermos ressarcidos de eventuais prejuízos. Alertámos o Sindicato de Professores do Norte (SPN) e da Zona Norte (SPZN) por escrito e telefone para a gravidade da situação e necessidade de tomar posição no sentido de uma fiscalização rigorosa, pois havia indícios de ilegalidades que poderiam redundar em prejuízos irreparáveis. Constatámos que quase ou nada foi feito pelas estruturas sindicais. Enviámos dois e-mails a Pacheco Pereira, que os inseriu no seu blog http://www.abrupto.blogspot.com/, assim como a Vital Moreira que o introduziu também em http://www.causa-nossa.blogspot.com/. Denunciámos toda esta situação em carta ao Jornal “O Público” que mereceu um longo parágrafo de Miguel Sousa Tavares na habitual crónica de Sexta-feira (daquele diário insurgindo-se contra os atestados médicos e a situação num tom e estilo violento como só ele sabe. Um e-mail enviado ao Diário de Notícias de denúncia do estado referido também foi publicado naquele jornal no correio do leitor. Temos intervido periodicamente no site do Sindicato dos Professores do Norte (SPN) alertando e denunciando a situação em http://www.spn.pt/Default.aspx?xpto=30&mid=122&for=5.

A indignação aumenta cada dia que passa e decidimos rapidamente convocar uma manifestação espontânea para o dia 6 de Outubro em Bragança. Através de contactos pessoais e recorrendo ao telefone, fizemos passar a palavra e sem qualquer participação de colegas de Bragança (a grande fatia do distrito) que a essa mesma hora se encontravam em reunião e de qualquer estrutura sindical, juntámos três dezenas de professores e vários órgãos de comunicação social. Entre outras, reivindicámos a suspensão dos destacamentos por condições específicas para uma análise rigorosa dos atestados médicos.

No local foi assinada uma petição que decidimos entregar em mão ao Senhor Governador Civil. Muito receptivo, compreendeu as nossas razões e ficou de ser portador das nossas preocupações à senhora ministra da educação, ao senhor secretário de estado da saúde e outras entidades da administração escolar.

A luta vai continuar até uma clarificação do imbróglio e o próximo passo será a consulta de um jurista para um eventual recurso aos tribunais. No horizonte define-se ainda uma manifestação em Lisboa.

Parafraseando o poeta e até que a voz nos doa, havemos de gritar: “Queremos justiça!”

Sem comentários: