19 março 2015

Salvem-se os sapos: Helder carvalho

Que é dos sapos? 
Dizem-me que tarda em chover e eu preocupo-me com os sapos.
Estes anfíbios costumavam aparecer com a chuva. Já alguém viu algum!? Se houvesse uma comparação possível entre um carrazedense como eu e um simples animal talvez a comparação pudesse ser com o sapo. Bicho inofensivo, como por exemplo o burro, que não precisa de ser carnívoro para se alimentar, o sapo é adulador mas também inofensivo. Quando enfuna é só para se ver enfunado, reflectido no charco. Não sei quais são os inimigos do sapo, mas dá a ideia que anda sempre assustado. Nem mesmo a pata do burro, que, quando desatento o pisa lhe dá a vontade de avançar mais rápido. O sapo não sobressai, vive na penumbra gramando a vida.   
 A falta de chuva preocupa outros, por outras razões. Por exemplo os nossos produtores de maçã, de certeza que recordam a última vez que choveu. De certeza que sonharam na altura com aquela ideia de haver maneira de se ter retido a água que correu em direcção ao rio. Para a rega das macieiras, só se justifica uma barragem de rega agrícola se não chove. Acreditemos então que a chuva chegará a tempo, para regar as macieiras e por tabela se criarão condições também para a protecção dos sapos. Contudo se a prioridade para mim e para os muitos ecologistas que os há, é a preservação da espécie – sapo, talvez se esteja a preparar para breve um ecossistema paradisíaco para eles. Refiro-me à  edificação do Campo de Futebol do Carrazeda. Estou convencido de que naqueles intervalos em que o relvado estiver disponível, este será um paraíso para os nossos sapos de estimação.
 Para finalizar procurei um poema adequado, mas não consegui encontrar nenhum que estabelecesse a relação entre macieiras e sapos. 
Paciência.


Os Sapos
Manuel Bandeira, 1918

Enfunando os papos, 
Saem da penumbra,
 
Aos pulos, os sapos.
 
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra, 
Berra o sapo-boi:
 
- "Meu pai foi à guerra!"
 
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".
O sapo-tanoeiro, 
Parnasiano aguado,
 
Diz: - "Meu cancioneiro
 
É bem martelado.
Vede como primo 
Em comer os hiatos!
 
Que arte! E nunca rimo
 
Os termos cognatos.
O meu verso é bom 
Frumento sem joio.
 
Faço rimas com
 
Consoantes de apoio.
Vai por cinquüenta anos 
Que lhes dei a norma:
 
Reduzi sem danos
 
A fôrmas a forma.
Clame a saparia 
Em críticas céticas:
 
Não há mais poesia,
 
Mas há artes poéticas..."

Helder Carvalho

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