30 janeiro 2011

A Insustentável Ligeireza da Consciência: Daniel Conde

A Insustentável Ligeireza da Consciência

Cavaco Silva, o candidato, deslocou-se a Mirandela às 17 horas do dia 12 de Janeiro do corrente ano. Na agenda, uma visita a três fábricas da zona industrial, área que confina com o traçado da Linha do Tua no percurso entre Mirandela e Carvalhais, onde antigamente existia um ramal de mercadorias. De seguida, a agenda marcava uma visita a Macedo de Cavaleiros e jantar/comício em Bragança.
15 de Dezembro de 1991: o troço Mirandela – Macedo de Cavaleiros é encerrado por questões de segurança. Dois dias depois, graças a um descarrilamento, o troço Macedo de Cavaleiros – Bragança, que havia ficado isolado do resto da Linha do Tua, é também encerrado. A 14 de Outubro de 1992, praticamente 10 meses depois, a CP, num acto de pirataria, levava em camiões o material circulante resguardado na estação de Bragança, defendidos por um forte dispositivo policial, e por um inexplicável corte de comunicações telefónicas na cidade. Era Primeiro-Ministro Cavaco Silva, e esta Noite do Roubo marcou o fim do genocídio ferroviário do professor e economista perpetrado entre 1987 e 1992, alcançando a soma de 860Km de caminhos-de-ferro encerrados. Destes, 185Km (21,5%) pertenciam ao distrito de Bragança.
Levei uma faixa à zona industrial de Mirandela, para receber o candidato e ex Primeiro-Ministro. Nela apus uma pergunta de retórica: “Senhor Presidente, veio de comboio?”. À chegada, o candidato, ex Primeiro-Ministro e actual Presidente da República, dirigindo-se à faixa e a mim dizia com ar de júbilo “Eu gosto muito de andar de comboio”. Confrontado ainda com um DVD do recente filme “Pare, Escute, Olhe”, totalmente devoto à História recente da Linha do Tua, e com um dossiê com todos os comunicados do Movimento Cívico pela Linha do Tua, Cavaco, o candidato, ex Primeiro-Ministro, Presidente da República, professor e economista, titubeou, e tentou contornar o incómodo falando de uma linha que afinal não é a Linha do Tua, mas sim a do Douro, e de uma barragem, sobre a qual diz não se poder pronunciar.
Para fechar com chave de ouro, em resposta a um jornalista que lhe lembrava que enquanto Primeiro-Ministro tinha sido responsável pelo encerramento de 860Km de caminhos-de-ferro em Portugal – ao que eu acrescento a consequente responsabilidade pela asfixia económico-social que daí adveio, sobretudo em Trás-os-Montes e Alto Douro e no Alentejo – Cavaco, o homem, respondeu que tem “um grande orgulho” no que fez enquanto Primeiro-Ministro, e que o país deveria partilhar desse orgulho.
Como devem dormir bem os homens sem consciência nem moral, que nunca se enganam, raramente têm dúvidas, avisam atempadamente tudo e todos sobre o futuro, e que contam com o voto do embrutecido e amnésico povo…

Daniel Conde
Mirandela, 13 de Janeiro de 2011.

4 comentários:

Anónimo disse...

Pelos vistos no nosso distrito há muitas pessoas a partilhar desse "triste" orgulho. Portugal talvez estivesse bem melhor hoje em dia se nunca tivesse existido um Cavaco a nivel politico.

Anónimo disse...

Muito bem, Daniel Conde! Eis aqui um texto que é certeiro como uma seta despedida até ela própria bater e ficar a vibrar bem no centro do alvo-circulum... Mas como se vê, mesmo assim, a zona do país onde o "rebanho" é mais ordeiro e cego, é nos interiores de trás-os-montes e beiras. Claro que há explicações antropológicas para isto, mas de que vale? Um rebanho será sempre um rebanho... e para isso há sempre explicações... zoológicas!

K

Anónimo disse...

Meus amigos o povo transmontano não quer comboios, querem auto-estradas, mas desenganem-se aqueles que pensam em auto - estradas de borla.
E auto-estradas porquê, porque o povo transmontano, e os portugueses em geral, não sabem o que é viajar em comboios modernos, a sua rapidez, conforto e segurança, e porquê, porque nunca os viram, a sua memória ficou-se pelos obsoletos comboios a que sempre foram habituados.

mario carvalho disse...

Por falar em falta de consciencia , ou de vergonha

http://noticias.sapo.pt/info/artigo/1127446.html

Tarifa Social: Desconto anunciado reduz-se a cêntimos e em vez de apoio já deu gasto a carenciados
05 de Fevereiro de 2011, 09:55
Quando Diamantina Veiga recebeu a carta da Segurança Social e lhe disseram que era para ter desconto na luz pensou que “fossem 20 euros ou até mais” sem nunca calcular que o que estava reservado eram 59 cêntimos.
“O que é isso? Não é nada”, foi a reação de quem com, 78 anos, se deslocou ao balcão da EDP a Bragança para requerer a tarifa social.
Mas perdeu a viagem porque não conseguiu “meter a papelada” e pagou mais de táxi do que o desconto que pode vir a ter e que varia entre 40 e 80 cêntimos/mês no total da fatura de eletricidade.
A medida foi anunciada pelo Governo como apoio aos mais carenciados e em janeiro a Segurança Social enviou cartas a beneficiários de prestações sociais para atestarem a condição de beneficiário desta redução na conta da luz.
“Eu tive a carta em casa muito tempo porque nem queria ir lá”, contou Diamantina, que só passados 20 dias é que se entusiasmou a fazer os 20 quilómetros que separam Babe de Bragança.
“Juntámo-nos quatro que tinham as mesmas cartas e fomos num táxi”, contou, explicando que pagaram cada uma, três euros pelo transporte partilhado.
As outras mulheres acabaram por entregar a papelada, mas Diamantina perdeu a viagem porque o contador está em nome do falecido marido e precisa da certidão de óbito para a transferência de propriedade e para beneficiar da tarifa.
Maria Rita, de 84 anos, recebeu a carta há 15 dias, em Moredo, e “pensava que era para fazer a prova de vida”.
Ainda não fez nada com ela, porque também não sabe o que tem de fazer, mas para quem gasta “muito dinheiro em medicamentos dava-lhe jeito um desconto”.
Na mesma localidade, a 25 quilómetros da cidade, vive a nora Ângela Monteiro, beneficiária do RSI, que tem opinião diferente: “Se vier cá de propósito não compensa” pois a viagem de ida e volta fica em 02,40 euros.
Ainda vai “pensar se realmente vale a pena o trabalho” porque não sabe “se é uma coisa simples ou se tem de andar aí às voltas”.
“Acho que não é um apoio porque se estamos a ser beneficiários do RSI é porque precisamos mesmo e esse desconto não favorece assim tanto como isso”.
No concelho de Freixo de Espada à Cinta não há um balcão da EDP, o que obriga as pessoas a deslocarem-se 50 quilómetros até Torre de Moncorvo, com um gasto mínimo em transporte público que ronda os 16 euros de bilhete de autocarro ida e volta.
Quando começaram a receber as cartas, Rui Portela, presidente da Junta de Poiares e carteiro no concelho, foi informando do que se tratava e garante que “umas rasgaram as cartas e outras guardaram-nas”.
“Ainda tinham de pagar a um eletricista para adaptar o contador, tinham de o ter em nome delas e são pessoas com reformas baixíssimas. Isto é ridículo e nem representa nada na vida das famílias” diz o jovem autarca, contando que alguns “entenderam aquilo como para tapar os olhos ao povo”.
O acesso à medida também está disponível pela Internet, mas nem muitos destes beneficiários sabem lidar com ela, nem quem sabe o consegue numa zona onde não chega o sinal das novas tecnologias.
@Lusa