Cego é aqui entendido como aquele que não quer ver. Se assim fosse, julgo eu, que não veria também, todos os outros cegos que houvesse. Deixaria pois de me importar, se viveria numa terra de cegos, ou não.
Claro que não tendo esta debilidade física, me fica ainda a possibilidade de não ver o que não importa. Tentar não detectar o erro, a incúria, o desleixo. Tentar não notar a pobreza de espírito, a ignorância, a prepotência. Em concreto: tentar fazer como a avestruz quando pressente o perigo. Para este exemplo, contudo, há uma anedota que nos alerta para o perigo de, enterrada a cabeça na areia, ficar desprotegida outra parte do corpo que muitos prezam.
Não importa, pois, filosofar sobre o assunto. Na prática é impossível permanecer cego, surdo e mudo apenas num espaço/tempo, concretos. Reata-me o esforço mental de procurar olhar sem ver, ouvir sem fixar, falar sem nada dizer.
Assim perdido o racional, anestesiado e auto-domesticado fica-me o sentimento. É, pois, neste estado de alma, sem pretensões e com humildade que me proponho, deste lado, dar o meu contributo para o tema actual a propósito de Carrazeda de Ansiães. Decidi seleccionar o poema de Fernando Pessoa:
“Ninguém a outro ama, senão que ama”
Ninguém a outro ama, senão que ama
O que de si há nele, ou é suposto.
Nada te pese que não te amem. Sentem-te
Quem és, e és estrangeiro.
Cura de ser quem és, amem-te ou nunca.
Firme contigo, sofrerás avaro
De penas.
4 comentários:
recordo-me da m�xima dedicada aos m�nimos:
- Numa terra de olhos quem tem um rei � cego.
� sempre um prazer l�-lo
m�rio
Grato pela sua apreciação. Não fica mal aprender-mos com os sociólogos.Já agora pedia que me ajudasse a entender, com a ajuda dos sociólogos, que consulta, porque é que gosto tanto de comer carapaus de escabeche!
Sem dúvida um contra-comentário de ALTÍSSIMO nível.
Está de parabéns Helder!!
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