10 abril 2007

CARTA AO SR. PRIMEIRO MINISTRO

«Caro sr. primeiro ministro,
Apesar de não ter votado em si, sinto que somos quase almas gémeas. Não admira: temos muito em comum.
Tal como o senhor, eu também não sou engenheiro.
Enfim, uma das muitas características que ambos partilhamos. E é por isso, por sentir que somos feitos da mesma massa, que me desgosta vê-lo metido em confusões. Esta história da Universidade Independente, em que ninguém percebe se, afinal, o sr. primeiro ministro se licenciou ou não, é muito desagradável.

Imagino que tenha prometido aos seus pais que acabaria o curso, e agora descobre-se que não o fez.
Para si não será propriamente novidade fazer promessas que acaba por não cumprir, mas uma coisa é o povo português, outra é a família. Não cumprir promessas feitas ao povo português durante a campanha eleitoral, normalmente, não tem consequências de maior, mas faltar ao prometido à mãe pode ter repercussões graves na vida de um político.
Sobretudo se esse político gostar que a mãe lhe leve um copinho de leite morno à cama. «Enquanto não acabares o curso, acabaram-se os miminhos», pode a mãe dizer. Um argumento que se rebate com dificuldade, até porque discutir com a mãe é bem diferente de litigar com o Marques Mendes.
As mães são muito mais tesas.

Além do mais, é importante não esquecer que a mãe do sr. primeiro ministro pode estar duplamente ressentida: como se não lhe bastasse a vergonha de ter um filho primeiro ministro, agora já nem pode dizer às amigas que, ao menos, o José é engenheiro.
No entanto, como em tudo, há um aspecto positivo no facto de não ter concluído a licenciatura.
Há muito tempo que a nossa democracia não dava um sinal de vitalidade tão grande.
O sr. é a prova de que qualquer um pode chegar ao segundo cargo mais importante do Estado: o nosso sistema político não discriminar ninguém por ter menos habilitações literárias.
Por outro lado, receio que este caso da Universidade Independente fique associado a si para sempre. Até pelas semelhanças de estilo que existem entre aquele estabelecimento de ensino e o seu Governo: há tantas trapalhadas na Independente que às vezes ficamos com a sensação de que a universidade é dirigida pelo seu ministro Manuel Pinho.

Mas a razão que me leva a escrever-lhe é a seguinte: apoio a sua intenção de submeter os funcionários públicos a exames de avaliação, e ir dispensando os menos capazes. Mas, para ganhar tempo e dinheiro, talvez um bom método fosse começar por dispensar os que têm menos habilitações. Imaginemos um funcionário público que não terminou a licenciatura em engenharia, por exemplo, esse era logo dos primeiro a ir para a rua. É só uma dica.
Um abraço do Ricardo»

Ricardo Araújo Pereira, in Visão

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