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O diagnóstico veio, finalmente: ouvido direito deprimido.
Eu já desconfiava que ouvia melhor do lado esquerdo há muitos anos. Coisas. Mas nunca imaginei que um ouvido tivesse depressões. Assim como quando nos zangamos com um velho amigo, perdemos um familiar ou um grande amor.
Pus-me então a pensar o que teria levado o meu ouvido direito a ficar deprimido nas últimas semanas.
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Mantenho a dieta rigorosa de televisão e telejornais, mas, mesmo reduzindo o consumo de calorias mediáticas, acabo sempre por ver e ouvir (lá está!) o que não quero. Nos últimos tempos tenho escutado diversos especialistas desenrascar as justificações mais abstrusas para que Israel continue a bombardear o Líbano.
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Pensei depois que talvez fosse de ouvir o Governo falar mecanicamente como se tivesse apenas uma só voz. Mas lembrei-me que, tirando as dores nas costas, este Governo do engenheiro Sócrates não provoca grande mau estar. A estratégia de longa duração passa por falinhas mansas constantes, poucas ondas, nada de berros nem agitações para não perturbar a manada. E a Imprensa do Portugal sentado, já agora.
Ouvi também, embora já com dificuldade, Ribeiro e Castro convidar Manuel Monteiro (lembram-se?) para uns estados gerais da direita, mas aí o ouvido não pareceu deprimir, pelo contrário: a notícia foi como um bálsamo.
Lembrei-me depois que o ouvido poderia estar deprimido de tanto ouvir a marcação cerrada do PSD ao Governo. Mas aí pensei melhor e considerei mais provável que o ouvido estivesse a passar à fase do delírio, pois nem eu nem os meus ouvidos sabemos da existência de Marques Mendes há muito tempo.
Finalmente, o médico esclareceu-me que a depressão do meu ouvido era, afinal, provocada por uns pólipos no nariz.
Ora, apeteceu-me dar-lhe uma lista de algumas coisas que não me têm cheirado bem nos últimos tempos, mas aí decidi calar-me e aceitar, sem protesto, a prescrição de uma injecção de cortisona, dois vaporizadores e uma caixa de comprimidos. (...)»
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Miguel Carvalho, Visão
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