13 janeiro 2006

Do silêncio de nós ao antes Torcer que Quebrar


Quantas vezes me apetece gritar para não ouvir os gemidos altos que berram dentro de mim mas muitas vezes delicio-me no silêncio total de uma viagem de carro com a música baixinho para me encontrar melhor comigo porque, às vezes, faz-me falta ouvir-me, pensar em mim, de mim, para mim, dos outros, na minha vida. Mas reconheço que já tive momentos em que a música alta, o barulho, a agitação me fez bem…
Aprendi muitos conceitos, li milhares de páginas de manuais e sebentas, em cafés com música ou barulho em surdina de quantos os frequentavam…
Em nada devemos ser taxativos e, por isso, o meio-termo, o quanto baste, em tudo é preferível ao fundamentalismo, pois, quantas vezes quem cala consente, embora saibamos que “o silêncio é de ouro” também e, como diz o povo judeu, temos de ter medo de quem começa a falar depois de ter estado em silêncio durante muito tempo.
Calar e falar, são duas realidades numa só. Se nos pedem segredo é para calarmos, se nos pedem para dizer é para não calar e, quantas vezes, o silêncio pode ser sinal de cumplicidade, de muitos males, de muitas injustiças…
Seja como for, gosto de passar em silêncio junto a quedas de água, barragens, ouvir o sussurrar das águas das ribeiras e rios, faz-me bem, transporta-me para a ribeira da minha terra natal, Zedes, e para o Rio Cunene que passa na Matala-Angola, terra onde cresci até aos 17 anos…
Ai de mim sem alguns amigos, o mar, sem o rio, sem a água, sem o silêncio, sem os efeitos do amor, sem as palavras ditas. Destas, às vezes tenho medo do efeito que provocam, porque nunca sei que interpretação fazem os que por perto apanham meias frases e as tomam por completas e geram por vezes tamanhas confusões…como as palavras apanhadas que escorrem de lábios de gente que se encontre numa fonte e são agarradas por gente autofalante.
Mas o silêncio é de ouro e nem todos os ouvidos estão preparados para nos ouvirem tudo o que nos vai na alma. Por isso, a teoria do justo meio também se adequa para o calar e para o falar, para assim não nos chamarem arrogantes ou faladores.
Estar calado ou ter de falar são duas dimensões que têm de ser usadas sabiamente para se evitarem males maiores e para isso também é preciso coragem…Quantas vezes as pessoas se sentem desconfortadas ao pensarem que as suas palavras pareciam dar entender uma coisa e o que no fundo queriam era outra, e quantas vezes geram-se equívocos… mas a vida é assim!
E saber estar calado quanto baste num mundo de tanta palavra é uma sabedoria, pois não é obrigatório em momento algum “preencher os silêncios” todos, é que, como diz António Barreto, no Público, “ o mestre do silêncio é aquele que domina a palavra. E que a usa quando deve ser.” Pois quando se vive rodeado de segredos é exigente para quem os guarda pelo facto de ser bom ouvinte e dar segurança a quem os deposita mas quando nos ouvem e nos traem?
A par do controlo da palavra está o controlo do espírito que é essencial ao refreio da dor, seja ela física ou emocional mas sobre estas realidades noutra ocasião falaremos se tivermos tempo de falar escrevendo e revelando o possível dentro dos impossíveis que os limites da vida nos colocam a cada momento que somos chamados a pensar antes de falar…
Mas já há muito tentei compreender o ditado ocidental e arreigado em Trás-os-Montes”, de que fala o Torga, “o antes quebrar do que torcer” que na perspectiva Taoista, do nada é por acaso, sou levado a entender essa ideia dado que em Trás-os-Montes além de pinheiros, castanheiros e giestas, não abundam muitos chorões e por isso esse provérbio também determine certas atitudes, mas eu estou mais virado para a metáfora taoista que contribui para uma dimensão de vida mais fácil, sem fundamentalismos rígidos e inflexíveis tão contrários à dimensão democrática e socrática da vida. É que segundo a referida metáfora, e que Ricardo Belo de Morais, na NM refere, “ o ramo de um chorão, flexível, verga ao peso da neve - voltando, mais cedo ou mais tarde, à posição inicial. Já o ramo de um pinheiro, por ser rígido, parte-se quando é sujeito à mesma adversidade.” Se podermos evitar que fiquem marcas, por causa do falar ou do calar, que caia algum ramo de nós, importa por vezes interferir quando se deve fazer mas, o melhor é deixar que as coisas sigam o seu curso normal. Tudo depende…os contextos também contam!
J.M.S.

2 comentários:

Hélder Rodrigues disse...

Este é um belo texto reflexivo, próprio de quem tem uma vida inteira para contar, mas sempre tentando gerir palavras (conceitos) com silêncios. Contudo, nesta abrangente dicotomia "silêncio/palavra", julgo, em minha modesta opinião, que, (quase) ao contrário de A. Barreto, O MESTRE DA PALAVRA É AQUELE QUE SABE GERIR O SILÊNCIO!

Um abraço amigo ao J.M.S.


mota

Ricardo Belo de Morais disse...

Caro José,
Aqui vim dar por via de uma pesquisa boleana feita pela minha editora; e deixo-lhe um abraço. É sempre agradável sermos citados no contexto próprio e - mais ainda - num texto com sentimento.