10 setembro 2006

250 anos da Criação da Região Demarcada do Douro

“O desgraçado Doiro tem a suas pedras descarnadas como ossos secos num deserto. Tanto vinho generoso que deu, tanta força a rasgar rochedos desde a nascente até ao mar, e nada. Nem uma pintura, nem um poema, nem uma história! Suor, suor, suor, e a espadela dum barco Rabelo, pesada como um látego, a açoitar-lhe o lombo doirado”.

Miguel Torga in “Diário III”, Pinhão, 25 de Setembro de 1945

A 10 de Setembro de 1756, faz hoje precisamente 250 anos, D. José I apunha a sua assinatura num dos documentos régios que haveria de marcar a história ao longo das gerações futuras. O alvará que instituía a Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro forneceu o código genético que condicionaria a evolução de uma região, o Douro, e a do principal produto da história económica do país, o vinho do Porto.


Nos estatutos da Companhia previa-se a classificação dos vinhos em três classes: de feitoria, mais caros, destinados à exportação para as ilhas britânicas; de embarque, de qualidade e valor intermédio, direccionados para o Brasil; e de ramo, de qualidade inferior, obrigatoriamente consumidos na região ou nas tabernas do Porto. Estas qualidades seriam produzidas numa área de cerca de 40 mil hectares (pouco menos de um sexto da demarcação actual) cujas fronteiras seriam assinaladas por 335 marcos de granito. No interior deste espaço, um corpo de provadores garantia a qualidade do vinho armazenado, conferia quantidades e emitia certificados de proveniência.

Dotada de inúmeros poderes (incluindo uma espécie de justiça própria) e de privilégios, a administração da Companhia facilmente resvalou para a brutalidade e para a corrupção. Fidalgos próximos de Pombal foram autorizados a introduzir os seus vinhos na zona de demarcação para beneficiar dos seus preços. O próprio Pombal se encarregou de escoar parte da produção das suas vinhas de Bucelas como vinho de feitoria. As devassas feitas pelos seus agentes no Douro aterrorizaram os lavradores; a ordem de mandar arrancar sabugueiros em todas "as províncias do Norte" fazem-nos hoje lembrar os métodos maoístas na era do Grande Salto em Frente; e o abuso da sua posição monopolista em relação às tabernas do Porto ficou patente na série de motins populares de 27 de Fevereiro de 1777, que resultaram na acusação de 478 pessoas e na condenação à forca de 21 - outros 120 foram condenados ao degredo.

O vinho do Porto torna-se a bebida nacional dos britânicos e o seu consumo alastra dos colleges às tabernas de Londres, dos membros do Parlamento aos marinheiros da Royal Navy. Em 1788, a área demarcada é alargada de modo a que o potencial produtivo regional pudesse responder a esta procura crescente do mercado inglês, onde o vinho do Porto detinha uma quota de 75 por cento do mercado.

O Alto Douro vinhateiro é uma região classificada pela UNESCO como Património Mundial, pela sua riqueza natural, paisagística, cultural e histórica, produz a marca mais emblemática do país, o vinho do Porto, vinhos de mesa e, entre outros bens, energia eléctrica. Ainda assim, continua a ser uma das regiões mais deprimidas do país. Está, aliás, entre os cinco piores territórios nacionais em termos de indicadores sociais e económicos.
(...) segundo dados do INE, entre 1981 e 2001, o Douro perdeu cinco habitantes por dia; entre 2001 e 2004 perdeu três.

O Douro é a região vitícola que gera mais receitas fora do país, sobretudo graças ao vinho do Porto, que representa mais de 60 por cento das exportações portuguesas de vinhos e cerca de 20 por cento do total das exportações de produtos agro-alimentares.



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