29 janeiro 2006

TEATRO DO ABSURDO

Sem música, a Vida seria um erro.
Nietzche

Cara Rita T,
mesmo que achemos as opiniões dos outros menos conseguidas, devemos respeitá-las. E não diminuir os Outros com o não-sentido, só porque achámos que a nossa razão é maior. Por mim, o assunto está terminado — já entendi a Zaratustra, ele já me entendeu... Que só lhe pedi uma coisa: autenticidade. E, se o desejar(em), estarei disponível para tomar metaforicamente um café, num local sem pseudónimos... por muito que esteja ocupado com a encomenda do Hélder de Carvalho — dos cegos com acordeão... Agora,
se deseja a minha opinião sobre o Rui Veloso, devo confessar-lhe que lhe vejo alguma qualidade, embora apenas seja tocado pela letras do meu amigo Carlos Tê. Claro que tem uma voz única, pela forma singular como conseguiu (vocalmente) a nacionalização dos blues... Mas, para mim, orquestralmente nunca foi inovador nem alguém que levou a canção pop/rock ao 'progresso', um passo à frente. Se não, experimente — ouça tudo sem o canto... Mas não lhe quero estragar (longe de mim) a admiração. Aliás, o debate (para mim) não estaria entre o do meu Gosto e o dos Outros, mas entre o Gosto e a Qualidade. Dois exemplos
— um da música clássica (Mozart); outro da música pesada, já um clássico (Slayer). De acordo com um grande musicólogo — Harnoncourt: ‹‹Mozart não foi um inovador na sua arte como Monteverdi ou Wagner››. E eu diria, como Augusto M. Seabra, nem como Haydn e Beethoven, nem como Schoenberg, Stockhausen, Boulez. Mas nenhuma arte é apenas a história formal das suas inovações; caso o fosse, seria tender à consideração em abstracto,
não vendo que normalmente é no pós-revolução que a nova forma é levada a seu limite: como foi _ Caso de Mozart, que trabalhou com velhas fórmulas e convenções — mas soube injectá-las de uma energia nunca/jamais ouvida, conectando a música directamente ao coração, como se o diabo nos possuísse e o corpo todo fossem cordas de Eros... Ou seja,
temos de atender também a uma relação estética do autor e da obra com a sua recepção. Do mesmo modo, os Slayer não vieram inovar o metal, como por ex. Van Halen, aplicando à guitarra pesada a técnica do flamenco. Mas deram um passinho em frente — que poderíamos ler dos vectores da Física: + força e muito + velocidade! Que o noise das guitarras é motivado por aquele ritmo diabólico da bateria, que não lhes dá tempo para meter uma frase! Mas não é por eu gostar de Slayer que vou dizer que é muito bom... Aliás,
tento sempre descentrar do Eu, no sentido de analisar qualitativamente uma coisa, distanciando-a do gostar. Que posso gostar de uma coisa e não a achar grande coisa. Como vice-versa.

vitorino almeida ventura

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