18 setembro 2014

A Senhora da Assunção aparecida em Parambos

– Uma viagem à Casa da Moura ii –

De cada um destes altares esguios, os miradouros de Carrazeda de Ansiães, majestosos e suspensos nas nuvens, pode desfrutar-se dessa paisagem natural deslumbrante, imponente e a perder de vista. Paisagens que os mortais aproveitaram para implorar a misericórdia dos deuses, apaziguar a sua ira oferecendo sacrifícios nas aras de granito, com eles dialogar inscrevendo nas pedras sinais para os deuses entenderem ou neles erigir belas construções e memoriais de fé. Não será de estranhar esta história, que se fala por aí, e vamos recontar, porque o sagrado sempre preferiu a largueza de horizontes, a beleza envolvente, o silêncio e o encanto das paisagens grandiosas.

Há muitos anos, a Senhora da Assunção, que está no cabeço em Vilas Boas, apareceu primeiro em alguns destes miradouros de Ansiães. Em Parambos, num monte que é conhecido por “Cabeço”, lá nas fragas que aconchegam a aldeia, apareceu Nossa Senhora a uma pastorinha. Será justo aqui perguntar, porque serão os pastorinhos, quase sempre, os intermediários do divino? Talvez seja, pelo muito tempo que dispõem, o silêncio que os envolve e a magia da comunhão com a natureza. Talvez seja, porque o sagrado escolhe a simplicidade das suas origens e a sua pureza infantil. Talvez… A Senhora estava sentada numa cadeira de pedra e logo pediu pela boca da pequenina apascentadora que lhe fosse ali erguida uma capelinha. Informada a população de Parambos e logo crente porque na cadeirinha de granito estava sentada imóvel e calada tão distinta Senhora,vestida toda de branco e mais brilhante que o sol”, embora uma beata entendida logo assegurasse que era a Senhora da Assunção. O piedoso povo ali irmanado, não achando digno o lugar inóspito, pegou-lhe com todo o ardor religioso e imbuído de grande fé, em procissão, levou-a para a sua igreja. Prostrados em oração, todos ali se mantiveram até ao tocar das Trindades, tendo que regressar a suas casas porque a canícula do Verão obrigava a cedo levantar para as lides do campo, exceto a pastorinha que em transe mágico, hipnotizada e envolta da luz divina, ninguém conseguiu arredar para longe da linda Senhora. Só que Ela, no dia seguinte, bem de madrugada apareceu de novo sentada no mesmo cabeço, na mesma cadeira e junto da mesma singela pastorinha. A população tornou A ir buscá-La. Rezando e cantando levou-A de novo para a sua igreja. Pois podia lá haver lugar mais digno e magnífico que o seu magnífico templo? E tudo se repetiu. Foi então que, ao terceiro dia, cansada de ver a Sua vontade contrariada, a Senhora que dizia ser Do Céu levitou na cadeira, com uns pés poisados numa nuvem mais alva que a neve, elevou-se nos ares e desapareceu. Como se constata, só podia ser a Senhora da Assunção,
Foi aparecer no cabeço de Vilas Boas, já no outro concelho vizinho e rival, onde já existiria uma pequena capela abandonada que serviria de abrigo aos gados que pastoreavam a zona. Em quatro de Setembro de 1673, uma segunda-feira, a Virgem Maria, na forma de Senhora da Assunção, aí surgiu a uma outra menina, agora de Vilas Boas, com 10 anos de idade e logo pediu que lhe restaurassem a capela. Sabedores do sucedido na aldeia de Parambos, depressa retiraram os gados e no mesmo dia iniciaram as obras. A Senhora apareceria ainda mais duas vezes nos dias sete e oito desse mesmo mês. Os factos amplificados de boca em boca, mais ainda pelo sucedido em Parambos, deram fama ao local e originaram um grande corrupio de peregrinos que com as suas ofertas contribuíram para a edificação de um grande santuário, como ela pedira e onde agora lhe fazem uma grande festa como todos constatamos a 15 de Agosto. Bem recentemente o arguto e perspicaz edil vila-florense aí erigiu avultadas obras para honra e glória do seu concelho.

O certo é que, no alto do cabeço de Parambos, lá continua uma fraga com o formato de uma cadeira. Tanto mais que, todos os anos, no dia em que ela ali apareceu, esteja sol ou não, a fraga onde apareceu pinga. E dizem que no dia da sua festa, em Agosto, brota ainda com mais intensidade. O povo diz, e deve ser verdade, serem as lágrimas de Nossa Senhora, que chora por lhe não terem construído ali a capela. Só mais tarde, o povo de Parambos começou a pensar que ela queria lá ficar no termo. E isso fez-lhes pena. Fizeram então lá também uma capelinha. É uma capelinha pequenina, mas muito linda. Foi uma pena para a economia do concelho e também para a sua riqueza religiosa não se soubesse aceder aos apelos da simples pastorinha e que a verdadeira Nossa Senhora da Assunção agora more em Vilas Boas.

Foi também por esta razão que agora os pais atendem a todas vontades e todos os caprichos das suas crianças: tudo lhe fazem, tudo lhe compram, tudo lhe permitem, tudo lhe perdoam, estragando-os com mimos e transformando-os em pequenos ditadores: eles põem e dispõem. Perguntamo-nos: quem manda hoje em casa, os pais ou as crianças? Será que ninguém se pergunta que este endeusamento dos meninos minimiza os adultos e está a dar péssimos resultados. É óbvio que é preciso ouvir as crianças, mas nunca poderão ser elas a tudo decidir. Os pais não são respeitados porque não se dão ao respeito e por isso estamos a criar uma geração que não houve um não, que não tem respeito pelos mais velhos e pela autoridade e irá ter um duro embate quando confrontada com o mundo real.

Subamos lá ao alto dos miradouros para observar as obras da natureza e as edificações humanas, símbolos da fé, e se o tempo permitir refletir sobre a procura de infinito que sempre perseguiu o homem, ou tão só inspirar o ar puro porque é sempre retemperador para as agruras da vida e para recarregar baterias na luta do dia-a-dia.



Se quiserem connosco seguir na próxima viagem à casa da Moura, falar-vos-emos dum pobrezinho que transformou um pau de amoreira numa das mais belas figuras da arte sacra do concelho.

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