O secretário de Estado da Agricultura vem agora afirmar que
a solução passa pela venda de vinho, património e revisão dos estatutos.
Convém saber como chegámos aqui:
1932 – O Estado Novo aplica o corporativismo ao Douro e ao
vinho do Porto com a criação da Casa do Douro, do Instituto do Vinho do Porto e
do Grémio dos Exportadores. O Estado volta a assumir um papel preponderante na
gestão do sector. Nos anos seguintes, à Casa do Douro foram atribuídos poderes
para elaborar a atualização do cadastro, distribuir o benefício, fornecer
aguardente aos produtores, fiscalizar o vinho na região demarcada e conceder as
guias para os vinhos a serem transportados para o Entreposto de Gaia (decreto
de 30 de Abril de 1940); ao Instituto do Vinho do Porto dedica-se a controlar a
qualidade e à promoção externa. A paz forçada do sector suplantou o longo
período de penúria dos anos 40 e 50. Depois de 1965, a procura externa começa a
aumentar, o que permitiu algum desafogo e a opção pelo cultivo da vinha foi
generalizada a dezenas de milhares de produtores
1974 - O modelo corporativo foi extinto. A Casa Do Douro de
inscrição obrigatória chegou a representar 40 mil viticultores. Muita da
população a viver no Douro é proprietária de pequenas explorações e a
instituição foi o guarda-chuva dos seus rendimentos enquanto associados nesta forte
estrutura.
1990 - Os problemas importantes iniciaram-se com a compra
das ações da Real Companhia Velha. O objetivo era para além do papel de
regulação e de representação dos pequenos e médios vitivinicultores, intervir
no mercado do comércio e exportação. "O negócio" foi “encorajado” e “abençoado”
pelo então primeiro-ministro Cavaco Silva. A Casa do Douro nunca conseguiu
fazer valer os seus direitos enquanto acionista, comprou uma "guerra"
com os comerciantes que a acusaram de ingerência no outro lado do negócio. Esta
marcou o início do descalabro financeiro da instituição que chegou a ter
orçamentos superiores a 150 milhões de euros e foi bem mais poderosa do que
muitos ministérios.
1995- A região Demarcada do Douro viu alterado o seu quadro
institucional. Passou a estar dotada de um organismo interprofissional, - a
Comissão Interprofissional da Região Demarcada do Douro (CIRDD), no qual tinham
assento, em situação de absoluta paridade, os representantes da lavoura e do
comércio, com o objetivo comum de disciplinar e controlar a produção e
comercialização dos vinhos da região com direito a denominação de origem.
2003 - Este modelo sofreu nova alteração com a substituição da
CIRDD por um Conselho Interprofissional integrado no Instituto dos Vinhos do
Douro e Porto. Em termos formais, e conforme estabelece a sua Lei Orgânica, o
Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto (IVDP) faz a supervisão da viticultura
duriense cabendo-lhe a certificação dos vinhos da Região Demarcada e a
disciplina do sector na função fiscalizadora e sancionatória bem como, as
responsabilidades de gestão e coordenação da vitivinicultura duriense.
(Decreto-Lei 278/2003 de 6 de Novembro.
2004 – Para suspender uma penhora sobre a Casa do Douro e os
seus armazéns, colocou-se à venda um milhão de garrafas de vinho do Porto das
colheitas de 1963 e 1964, permitindo um encaixe financeiro de 35 milhões de
euros. Cada garrafa custava 40 euros (1963) e 35 euros (1964) e apenas os
cidadãos naturais da Região Demarcada do Douro e seus residentes podiam comprar
esse vinho. Ao todo, o produto em venda representa 3% dos stocks de vinho do
Porto da Casa.
2008 - O IVDP denunciou o protocolo que existia para a
gestão e fornecimento de dados do cadastro e o Ministério da Agricultura mandou
executar judicialmente os créditos que alguns organismos estatais tinham sobre
a Casa do Douro, dando um sinal claro que pretendia deixar de contar com a
instituição. Neste mesmo ano foi vendida mais de metade da participação que detinha
na RCV à Global Wines. Depois de perder o controlo sobre a aguardente, a
certificação e fiscalização dos vinhos do Douro e Porto, só restava o cadastro,
cujo valor era incalculável, uma vez que acumulava informações relativas a mais
de setenta anos de atividade.
2013 - O ministro das finanças, Vítor Gaspar, face às
dívidas aconselhava a instituição a fechar portas.
2014 - A Casa do Douro, que representa a produção vitícola
na região, é uma associação privada de direito público e de inscrição
obrigatória para os viticultores durienses. O governo propõe a venda de vinho
para pagar dívidas.
A perda de influência da estrutura associativa está também diretamente
relacionada com o aumento da concentração da produção do vinho do Porto. No
presente cinco grandes grupos controlam cerca de três quartos de um negócio que
se cifrou no presente ano em cerca de 400 milhões de euros. Os grandes grupos compram
sobretudo propriedades de alto valor, reforçando a produção própria dos vinhos
destinados às categorias especiais, vintage, late bottled vintage e
"porto" com indicação de idade, produtos ganham um peso crescente nas
vendas globais. Para as categorias especiais, recorrem cada vez mais à produção
própria; e, para os vinhos "standard", prescindem da qualidade dos
produtores-engarrafadores, comprando às cooperativas que acolhem as
micro-produções de muitos dos cerca de 40 mil produtores durienses, a maior
parte deles com colheitas inferiores a cinco pipas/ano (2500 litros). Daqui
decorre uma redução do chamado benefício, de 145 mil pipas em 2001 para as
menos de cem mil em 2013, diminuição dos preços pagos à produção a pipa está a
ser vendida entre a cerca de 900 euros, preços praticados há quinze anos.
A constante reorganização do sector por parte da
administração central não soube acautelar os interesses dos pequenos produtores
e da sua estrutura representativa. Pagar dívidas para recuperar a independência
e transformar-se numa associação livre de produtores parece ser a solução
consensual. Porém, há quem tema que com a venda dos seus estoques vão os anéis
e quiçá também os dedos o que poderá agravar os condicionalismos que sofre a
região
2 comentários:
"eles " não querem só os dedos
querem "TUDO" e sobretudo a "ALMA"
para ficarem só com seres abjectos para os servirem
A guerra entre a produção e o comércio existe. Como foi dito o ruinoso negócio com a compra de acções pela Casa do Douro, apadrinhado pelo governo da altura,foram e são os responsáveis pela actual situação.Quem sofre? Sempre os mesmos os pequenos viticultores que continuam na miséria e hoje mais do que nunca desprotegidos e explorados, pelos donos do Douro, as companhias de exportação do vinho do porto, os ingleses, donos das maiores quintas do nosso património mundial o Douro.
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