12 maio 2013

Enterrar a cabeça na areia



Cerca de 70 pessoas manifestaram-se pela preservação do Vale do rio Tua no pretérito Sábado. Do concelho, os simples dedos de uma mão sobravam para os contar. Esta é uma luta que aos naturais nada diz. Para os líderes locais, tudo não passa de folclore de uma "cambada" de ecologistas e "idiotas" verdes e cruza os braços. Lamenta-se: a preservação ambiental é a nossa maior riqueza e a base da construção do nosso futuro. O último relatório da UNESCO não garante, por causa da intervenção na barragem, a continuidade do património mundial.   O futuro perfila-se em tons de negro.
O vale do Tua é um ecossistema ribeirinho único na Europa, que neste momento está ameaçado pela construção de uma barragem, acrescido da irreversibilidade da “perda física” de parte da paisagem colocando em algum risco o estatuto de Património Mundial da Humanidade. Acresce a implicação que este “negócio” provoca na fatura elétrica dos consumidores que engorda a elétrica que opera maioritariamente em Portugal. Concluo que nenhuma compensação financeira pagaria as perdas. Porém, as contrapartidas são pouco mais que nada: uma diminuta produção de energia que não é relevante para o total nacional e uma mão cheia de nada para a região que vê degradar os seus principais recursos: o ambiente e a paisagem e que nenhum projeto de Souto Moura há de mascarar.

A missão da Unesco que avaliou, in loco, a compatibilidade da construção com o estatuto de património da humanidade, concluiu que “a conservação da área classificada não está efetivamente garantida” e puxa as orelhas à estrutura de missão do Douro que parece não assumir “as suas competências de direção do plano de gestão” e adverte o governo para a falta de aprovação e de consulta pública do projeto de linhas de alta tensão e de um plano de gestão de área classificada. 

Daqui resulta a avaliação de incompetência das duas unidades de gestão que operam na região: a referida estrutura de missão do Douro e a agência de desenvolvimento regional do Vale do Tua que têm pessoas, técnicos e presumivelmente meios (em nenhum lugar vimos, ouvimos e lemos o contrário). Um relatório que retira estas conclusões, só poderia ter como consequência a demissão dos responsáveis destas duas instituições.

Na segunda metade do mês de Junho, o assunto voltará à baila na sessão do Camboja da Unesco, com a aprovação do relatório. Sobre a má gestão da causa pública, posta em causa, a senhora ministra Assunção Cristas não tira ilações, concluindo que tudo é positivo porque há cooperação e transparência (?) e basta manter “o nível abrandado das obras”. 
Devagar, devagarinho se vai enchendo o ninho…

5 comentários:

mc disse...

Caro José Mesquita

óptimo artigo que eu tenho sugerido a quem , não conhecendo a realidade, se admira com a inépcia local..

Matam o irmão por causa de 1 metro de terreno ...para defenderem a honra dos antepassados e amouxam quando vem alguém de fora que lhes rouba tubo o que foi dos pais, dos avós, e de todos até aos princípios .. e que lhe deram o ser.. justificando-se com o :

que é que havemos de fazer? Eles é que mandam.. são os cães grandes!!

ou é mesma coisa que lutar contra moinhos de vento... como dizia um autarca

enfim ... FORTES COM OS FRACOS

abraço

mario

ps. Infelizmente nem no blogue , como anónimos , se manifestam

.....................

a foto é do amigo Renato Roque

mc disse...

Ah!

nem os filósofos de serviço aparecem

lol!

josé alegre mesquita disse...

Um lapso imperdoável. Parabéns ao Renato Roque. Uma bela foto.

Fernando Gouveia disse...

Já em tempos escrevi o que me sugeriu a emoção e as memórias de juventude a propósito do fim da linha do Tua. Trata-se, evidentemente, de mais um belo negócio para a maior empresa nacional de energia e de um acto de incultura política e desprezo dos valores por parte dos responsáveis políticos. O valor paisagístico, ecológico e identitário do vale do Tua não tem preço. Os que esperam receber um prato de lentilhas a título de compensações não têm consciência do património natural que o vale representa. Que as lentilhas lhes façam bom proveito. Quem tem alma transmontana não esquecerá que num certo momento do século XXI alguém traiu a identidade do vale do Tua.

Daniel Conde disse...

Bravo, gostei muito do artigo.

Sobre o papel cívico da região, tudo está perfeitamente dito: uma indiferença brutal, tanto no sentido intrínseco de mágoa, como de visceral estupidez.

Como um dos fundadores do MCLT testemunhei isso in loco durante anos - e em relação a Carrazeda ainda há na memória uma "atenuante", já que a vigília de há anos na praça Camões em Lisboa foi feita maioritariamente por pessoas oriundas deste concelho.

Enterre-se a cabeça na areia, sim; a tempestade há-de passar. O problema é que depois desta não virá bonança.