30 dezembro 2011

O EURO - Autópsia de uma Implosão: Carlos Fiúza

Cenário I - Uma guilhotina em “stand by”?

Cidade - Frankfurt (Alemanha)
Data - 30 de março de 2012
Hora local - 19:00 horas

O som estridente de uma campainha faz-se ouvir anunciando o encerramento da Bolsa de Valores, de longe o maior mercado financeiro europeu, com valores transacionados correspondentes a cerca de 40% de todo o PIB da Zona Euro.
Em Lisboa e em Londres (como em Madrid, Paris e Roma) os mercados já estão encerrados.
É sexta-feira.
Na manhã desse mesmo dia corre por toda a Europa a notícia de uma comunicação de “interesse de Estado” por parte de todos os Governos integrantes da Zona Euro.
Curiosamente (ou talvez não) em todos os 17 países da Zona Euro os respetivos altos representantes comunicaram que se apresentarão às 19 horas (hora de Londres) nas respetivas televisões nacionais para levarem a cabo uma “importante comunicação ao País”.
Imediatamente surgem notícias de que a negociação nas diversas praças internacionais (EUA, Japão, China e outras) foi interrompida.
As atividades não vão retomar e entrou-se, antecipadamente, em fim de semana.
Os mercados financeiros globais estão, assim, encerrados.
Em Lisboa são, agora, 19:00 horas (hora de Londres). A população não “desgruda” dos televisores.
A informação passada, simultaneamente, pelos diversos Governos europeus a toda a população é a seguinte:
- Divórcio por múltiplo consentimento (exatamente dez anos depois de um matrimónio contraído com juras de amor eterno) …
- O EURO ACABOU!
A partir daqui os países poderão caminhar por si próprios, elegendo as suas vias monetárias num quadro de uma União Europeia, agora reduzida a pouco mais do que a uma União Aduaneira.
Neste novo “enquadramento” europeu, alguns dos países superavitários (Alemanha, França, Áustria, Holanda e Finlândia) escolherão manter uma ligação estreita (e controlada) entre os seus câmbios.
Outros países estão por sua conta e risco.
É o caso de Portugal.
São decretados três dias de “feriado bancário”.
Até à próxima 5.ª feira (cinco dias com o fim de semana) não será possível fazer levantamentos. Uma frenética logística para fazer rolar uma nova moeda terá lugar. Os cartões bancários e as transferências eletrónicas serão os únicos meios que permitirão um quotidiano mínimo nacional.
Quando no dia 5 de abril de 2012 (quinta feira), de manhã, a população “correr” ao Multibanco para fazer levantamentos receberá, ainda, as familiares notas de Euro, mas agora todas elas estampadas com a designação “Escudo Novo”.
Os preços aparecerão denominados nas duas moedas (Euro e Escudo Novo) por algum tempo.
Ainda nessa mesma manhã, desse mesmo dia 5 de abril de 2012, em Portugal, 1 Euro valerá 200 Escudos, enquanto na Alemanha essa mesma moeda valerá 2 Marcos: isto é, 100 Escudos comprarão 1 Marco, tal como antes da extinção das moedas.
No final desse mesmo dia (5 de abril de 2012), porém, nas praças internacionais, o Escudo já terá perdido 40% do seu valor.
Numa dinâmica de mercados em tudo idêntica à crise Argentina em 2002, em poucos dias serão já precisos 500 Escudos para comprar 1 Marco e a quantia de valor contra o dólar terá sido na mesma proporção.
Sendo Portugal um país extremamente dependente das importações (35% do que comemos é importado), a inflação disparará e os bens importados tornar-se-ão cerca de 80% mais caros; apenas acessíveis, no curto prazo, a uma faixa muito limitada da população.
Entretanto o Governo, dada a extinção do Euro e no intuito de “salvar o possível”, terá já em marcha todo um processo de denominação da dívida (pública e privada) em moeda nacional (Escudo Novo).
Com esta nova denominação, e perante a previsível desvalorização massiva da nova moeda, a dívida dos bancos e das famílias (incluindo o crédito à habitação) deixará de ser tão asfixiante.
Este procedimento conduzirá, contudo, a que os países nossos credores (como a Alemanha) venham a sofrer graves prejuízos.
Será até possível que a Alemanha, neste cenário, nos venha a ameaçar com a expulsão da União Europeia, algo não contemplado no Tratado.
Como contrapartida, a moeda alemão (o Marco) ficará tão valorizada internacionalmente que as suas exportações perderão competitividade e as suas finanças públicas degradar-se-ão abruptamente.
E é neste “cenário” que Portugal poderá “jogar” o seu grande trunfo.
Numa Europa de “cada um por si”, se a Alemanha nos “ameaçar” com a expulsão da União Europeia, o Governo (e com ele o País) terá toda a legitimidade em retaliar: ameaçará de encerramento a joia da coroa alemã - a fábrica da Autoeuropa.
O que não convirá nada à Alemanha… (virá a precisar desta sua “fábrica de divisas” como de pão para a boca).
O baixo “custo” do nosso Escudo, associado à inegável qualidade dos produtos desta fábrica, gerará (neste cenário) uma posição imbatível quanto aos seus preços finais de produção. Esta posição permitirá repatriar chorudos lucros para a sede da Volkswagen na Baixa Saxónia.
Negócio, portanto, a não perder.
Em Portugal, no entanto, as rosas murcharão: internamente, o Escudo Novo trará a perda de valor dos depósitos. A fuga de capitais será imensa - a economia, já de si débil, mais que enfraquecerá. Os salários poderão perder valor, diminuindo o seu já fraco poder de compra.

Carlos Fiúza

PS1 - Os “cenários” por mim delineados não são caturrices de “Velho do Restelo”; muito menos são “adivinhação”.
Os Mercados Financeiros não têm “oráculos” - têm técnicos matemáticos (os chamados “Quants”).
A “compra e a venda” regem-se, agora, por fórmulas quânticas… o operador já pouco interfere. O tempo do “faro” pessoal passou… erro humano só já quase na interpretação das respectivas fórmulas. Por cerca de 20 anos fui interventor nos ditos “mercados” (Londres, Nova Iorque, Caracas, Roma, Paris, Frankfurt) … o meu “saber” é, assim, um “saber de experiência feita”.
Acreditem: não há aqui qualquer mistificação. Todos estes “cenários” são possíveis… infelizmente, talvez os únicos possíveis.

PS2 - Para a semana seguirá o segundo “cenário” - Portugal: “The Day After”.

2 comentários:

Anónimo disse...

É um dos cenários que podemos vir a viver, razoavelmente descrito mas algo optimista no que respeita ao nível de vida que seria só equiparado ao dos anos 70!

Ateu

Anónimo disse...

Eis aqui uma excelente prolepse, só ao alcance de um verdadeiro epicurista! Não o julgava tão premonitório, meu caro Carlos Fiúza! Mas é da vox populi que "entre mortos e feridos alguém há-de escapar"...
Só espero que 2012 venha desmentir categoricamente (já me servia sem o categoricamente) C.F. e que venha a ser um ano positivo para ele (C.F.) e para todos os portugueses.

h.r.