25 fevereiro 2005

Onde "pára" a oposição? (revisto)

A filosofia sempre teve como uma das suas principais razões de estudo a realidade como processo de construção do comportamento humano. Seria Hegel, no princípio do século XIX que introduziu um sistema para compreender a história do mundo, chamado geralmente de dialéctica. “Os elementos do esquema básico do método dialéctico são a tese, a antítese e a síntese”. A tese é uma afirmação ou situação inicialmente dada. A antítese é uma oposição à tese. Do conflito entre tese e antítese surge a síntese, que é uma situação nova que carrega dentro de si elementos resultantes desse embate. Em teoria, quanto mais confronto, melhor síntese se elaborará.
Com o tempo, a síntese torna-se uma nova tese, que contrasta com uma nova antítese gerando uma nova síntese, num processo em cadeia infinito. Tudo se desenvolve pela oposição dos contrários: filosofia, arte, religião, história e política são vivos devido a esta dialéctica. Então, tudo está em processo de constante devir.

A base filosófica da política moderna encontra-se neste pensamento. A morte de Hegel criou até dois campos de discípulos, completamente antagónicos: à direita e à esquerda. Neste, um dos seus seguidores mais conhecidos é Marx. Todos eles apontaram “utopias”, ou o “fim da história”, em que uma síntese perfeita, acabaria por resolver definitivamente o problema de contínua luta social e de ideias propostos pela dialéctica. Essas utopias, entre outras, denominaram-se, por um lado, de fascismo e, por outro, socialismo, e numa fase posterior, comunismo.

No campo da política que é a ciência, arte ou tão só um articulado de ideias ao serviço da organização social, do melhoramento das condições de vida das populações, na definição de leis ou postulados para uma melhor vivência social, esta teoria tem ainda grande cabimento.
Sabemos que um bom governo necessita de uma oposição forte, valorosa, atenta, responsável, empenhada. Cremos que onde as oposições se diluem ou se demitem das suas funções, são também responsáveis pela estagnação, conformismo e logo ausência de progresso. O voto maioritário permite que a tese vencedora seja posta em prática, mas ela precisa de ser confrontada permanentemente pela sua antítese, solidifica, enriquece, é posta à prova.
A falta de desenvolvimento verificado nas ditaduras tem como razão o esmagamento dos antagonismos. A teoria dialéctica não se cumpre. Foi assim no período do Estado Novo, corporativista e monopolista, nos tornámos no país mais pobre da Europa,. Foi assim na ex-URSS, em que sem confronto de ideias, conservadora e politicamente monocromática, estagnou, tornou-se pantanosa, apodreceu, esboroou-se e até implodiu.
Sem oposição organizada e actuante, a dialéctica não se realizou e nem se cumpriu o fim da história.


A oposição estimula o debate, espicaça, dá alternativas, chama a atenção, despoleta situações pouco claras, apoia criticamente, contradiz, denuncia, mexe, levanta a voz, grita, esbraceja, dá um murro na mesa: é a antítese na teoria dialéctica para que a síntese se faça e o devir aconteça.

No campo da administração local, não conheço qualquer estudo realizado, mas seria muito interessante verificar se os concelhos do país mais deprimidos e parados no tempo, não devem também esta situação a falhas ou ausência de oposição. Pegamos em dois concelhos vizinhos: S. João da Pesqueira e Vila Flor. Na Pesqueira não houve ou quase não há contraditório, o seu desenvolvimento urbano a olho nu é muito deficiente. Em Vila Flor teve sempre uma tradição de oposição credível e empenhada e detém, sem qualquer comparação, um muito maior desenvolvimento urbanístico.

Em Carrazeda de Ansiães, da oposição nada transpira, não se sabe o que faz, não conhecemos as suas ideias, dilui-se no executivo vencedor, é o “unanimismo”, “estão todos na mesma mesa do poder”. Nas sessões da Assembleia Municipal nada se discute, é a completa sensaboria, o aborrecimento, um grande bocejo. As deliberações são feitas quase sempre por unanimidade. Idem aspas para a vereação. Nem um sussurro.

Não há oposição. Faleceu? Paz à sua alma!

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