A maior parte das quintas do Douro estabelece-se na segunda metade do
século XVIII. No século seguinte, já os vinhos das quintas se vendiam em
Inglaterra. As marcas com os nomes das quintas vão-se impondo principalmente na
segunda metade de novecentos.
Com a filoxera obriga à venda a preços de saldo dos terrenos do Douro e é
por essa razão que os comerciantes de Vila Nova de Gaia entraram em força no
Douro.[1] “O
modelo das quintas mantém-se grosso modo intacto desde o século XVIII. Os
edifícios principais são feitos contra um socalco. Integram uma casa principal
– a casa do patrão. Atrás desta fica a adega, tradicionalmente servida de lagares
de granito. Por baixo da casa situam-se os armazéns, que aproveitam as leis da
gravidade para o transporte do vinho”. (Cf. Bessa, Luísa e Carvalho, Manuel, “O
Douro das Quintas” in Público Magazine”, n.º 188 de 10 de Outubro de
1993, p. 29) Normalmente, a quinta inclui também a casa para os caseiros e para
os trabalhadores sazonais que são autênticos depósitos para “animais” como
Torga retrata no romance “As Vindimas”. Há modestas casas até à versão de
solar, onde a influência inglesa é marcante. D. Antónia Ferreira, “a
Ferreirinha” deixa à data da sua morte, em 1896, 24 quintas aos seus herdeiros.
No mapa do barão de Forrester em 1852 são referidas no Douro 79 quintas. De
acordo com A. L. Pinto da Costa, Carrazeda de Ansiães possuía 27 quintas em
1943 para um total no Douro de 827.
Como conto em “Selores… e uma casa, «Depois da escola primária
obrigatória começa a idade para trabalhar e ganhar o sustento para si e a
família. Os poucos que escapavam iam para o ciclo preparatório da vila ou do
seminário; os outros iam para o “ciclo” das quintas. Começava-se como “moço” e
o trabalho consistia em servir á frente dos bois e fazer os recados. Ir buscar
a água, o vinho, a comida, o que lembrasse ao caseiro ou ao feitor.
A procura do trabalho nas quintas do Douro era muito inferior à oferta.
Com o coração cheio de esperança, lá se ia a caminho das quintas dos
"Canais", da "Espanhola", da "Senhora da
Ribeira", do "Ministro", do "Eng.º Faria", do
"Chaves", do "Comparado", dos "Carris", do
"Gouveia", do "Carvalho", do "Zimbro"... Traçada
no ombro, transportava-se a enxada que deveria ter um tamanho razoável, pois,
de contrário faria torcer a “beiça” do feitor (sempre “implacável e cruel”); a
tiracolo o saco de linho ou de serapilheira com o pão de centeio duro e amargo;
nos lábios e no olhar a súplica do “Arranje-me lá trabalho pela alminha de quem
já lá tem”. Caído no goto do “carrancudo” feitor lá vendia o suor e a alma por
25 tostões.
Eram “felizes” os admitidos. A jorna era de sol a sol quer chovesse, quer
nevasse ou o sol desancasse. O trabalho de empreitada não admitia demoras, nem
atrasos. O que se ficava para trás na função da poda, da cava ou descava, da
redra… pagava com a vergonha do desconto no salário, a possibilidade de ser
posto “em marcha” ou, principalmente, o constrangimento perante os seus pares.
Irmanados na “miséria”, eram cruéis neste tipo de desgraça do próximo.
Para acompanhar o pão rijo levado de casa era servido o “caldo" de
feijão ou feijoca, aguado, desenxabido e temperado, não poucas vezes, com as
larvas do dito e o unto rançoso. À noite, doridos do trabalho e depois da
mistela sorvida com grandes tragos, deitavam-se como o “gado” e a monte no
“cardanho”, onde percevejos e piolhos se refastelavam com o “sangue quente da
manada”. Anestesiados com o cheiro nauseabundo e extenuados pela dureza da
"jorna", depressa dormiam. Recebido o “pré”, o seu fado era igual aos
que foram “rejeitados”. Continuavam igual - os mesmos desgraçados.»
[1] Cf. Bessa, Luísa e
Carvalho, Manuel, “O Douro das Quintas” in Público Magazine”, n.º 188 de
10 de Outubro de 1993, p. 29.
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