22 novembro 2011

O manguito: Carlos Fiúza

Era uma vez um Povo que tinha jurado a si mesmo deixar de sonhar em ser rico (como outrora) …
A dureza da realidade tinha-o tirado do sonho… (ou pelo menos assim pensava).

Tinha vendido ao desbarato a casa de férias na praia, o “todo-o-terreno” topo de gama… Os bancos estavam hipotecados ao BCE, as participações que ainda detinha na eletricidade (EDP), nos aviões (TAP), nas gasolineiras (GALP) e nas águas (REN) (mais tarde ou mais cedo) iriam ser trocadas por capitais chinês, alemão ou brasileiro (quando não por petrodollars angolanos).
Era tudo uma questão de preço... estava a dar em louco, sem nada ter para deixar aos seus filhos e muito menos aos netos!

Estava sem cheta, completamente desalavancado (como agora se diz). Os poucos anéis que ainda tinha eram de “pechisbeque”!

No entanto esse Povo (mesmo que às escondidas de si próprio) ainda era um sonhador!... Era o seu ADN!
Só que agora já só sonhava com “génios” matemáticos, financistas e quejandos, desses que fazem milagres e que prometem contas públicas em ordem, justiça célere, saúde e educação para todos (ainda que recicladas) …
E acreditava (tinha de acreditar) nas novas “Teorias de Mercados”…
Não tinham esses três “Reis Magos da troika” deixado nos cofres do Terreiro do Paço um novo cheque de oito mil milhões (ainda que embrulhado em mais pobreza, humilhação e lágrimas)?

Eis que…

PLIN!... Um som de garrafa a partir-se ecoou na sua mente.
Não, não era a “mini” que segurava, enquanto assistia a um enésimo jogo de futebol.
E aquele fumo que aos poucos o envolvia? O que era?
Rodou a cabeça, olhou mas não viu… tornou a olhar (agora mais atentamente) e finalmente viu…

Era um GÉNIO!...

Era realmente um GÉNIO, mas não um “génio” qualquer, diferente mesmo daqueles que estava habituado a ver nos debates da televisão.
E o Génio disse-lhe, com uma voz surgida do nada:
- Estou disposto a conceder-te UM desejo mas antes preciso de saber se o mereces. Como te chamas?

Assustado pela aparição, esse povo respondeu-lhe:

- Sou o ZÉ, esse que figura o Povo Português, criado no imaginário do Sr. Bordalo Pinheiro.

- Sou pobre (ou assim mo dizem) mas atenção: não sou parvo. Se fosses realmente o Génio que aparentas ser, concedias-me três desejos (como reza a lenda) e não apenas um.

E o Génio respondeu-lhe: Já olhaste bem para mim? Pareço-te, por acaso, algum banqueiro ou mesmo um político? Estive na garrafa muito tempo (mais tempo do que tu levaste a acordar)… estou destreinado e em baixa de forma, quase em fim de carreira. Nada sei de “Novas Oportunidades” ou lá o que essas geringonças são; como nada sei de “Mercados Financeiros” ou “Agências de Rating”. Portanto, é pegar ou largar. Só tens direito a um pedido. E mesmo esse terá de ser bem simples, qualquer coisa de que me lembre como se faz. E faço-te isto por me pareceres ser um gajo porreiro.

O ZÉ pensou estar a sonhar… só podia ser. Olhou melhor, atentou bem naquele figura vetusta e desalinhada, insegura até e pensou - Sonho ou não, nada tenho a perder… vou tentar.

Pensou em altruísmo e ainda se lembrou de nada querer para si.
Sugeriu, então, que fosse dada ESPERANÇA a todos os povos irmãos da sua Europa.

E diz-lhe o Génio:

- Esse teu desejo é difícil e nem os maiores génios da finança o conseguem realizar. Pede-me o possível.

Se a Esperança era negada, que pedir (pensou o Zé)? Paz Mundial? O fim da Fome? Seria impossível; era complicado e nada fácil.

E então alvitrou, ainda que a medo:

- Podes devolver os 50% do passe social para os estudantes?

- Impossível, disse o Génio. Se nem o meu primo, o Génio de Belém o conseguiu, como queres que o consiga eu?

- Já te disse, pede-me uma coisa simples, o mesmo que todos os outros me pedem.

- E então o Natal? Pode ao menos haver Natal este ano (insistiu o ZÉ)?

Mas o Génio (que pelos vistos não só não era cristão como tinha malapata com o Vaticano por causa da Benetton) replicou:

- Lá estás tu a complicar com pedidos esquisitos e cada vez mais difíceis. Olha, não queres antes uma “pipa” de massa?

Ainda que ingenuamente, o ZÉ refutou:

- E achas honesto o que me propões? Não achas egoísmo da minha parte se aceitar?

- Talvez, disse o Génio. Mas que importa? Os outros que se desenrasquem. Para ti deixaria de haver crise e poderias ter de novo as tuas casas, os teus carros… os teus luxos!

E o ZÉ cedeu!...

Pediu uma fortuna colossal, que o Génio concedeu sem esforço, como que aliviado… (e partiu, esfumando-se).

E não é que o Génio (destreinado como estava) deixou no colo desse povo milhões e milhões de euros…?!

Nisto, ouve-se um grito - Oh, não! Em “TÍTULOS DE DÍVIDA SOBERANA”, não!


E aqui nasceu o verdadeiro manguito do nosso ZÉ… o MANGUITO PARA SI PRÓPRIO!


Carlos Fiúza

5 comentários:

mario carvalho disse...

Palmas mais uma vez..

Anónimo disse...

Acabo de ler este "retrato" e logo ouço uma ovação estrondosa que vem das profundezas do écran diante de mim! E se este génio fosse um aladino em forma de coelho?...
Pelo menos eu não poderia tecer este comentário, pois estaria a fazer o manguito do zé povinho.
Os meus sinceroa parabéns (mais uma vez) para Carlos Fiúza!

h.r.

Anónimo disse...

Estrondoso, h r! Parabens.

Anónimo disse...

Apenas uma palavra:genial!

mc disse...

http://sorisomail.com/email/224587/the-codice--a-injeccao-da-banca.html