As pinturas
rupestres da Fraga do Cachão da Rapa nos termos de Ribalonga e Linhares são uma
das provas da antiguidade do povoamento nas terras de Ansiães.
O acesso à Fraga
do Cachão da Rapa, popularmente conhecida por “Curral das Letras”, faz-se pelo
lugar do Zimbro, descendo o caminho em terra batida, mas acessível para
qualquer veículo motorizado, até à estação de caminho-de-ferro com o mesmo
nome. Aí, segue-se pela linha do comboio de ferro até ao túnel da mesma linha
(km 142,2 da linha do Douro) a pouco mais de 2 km da estação do Tua (não deve
esquecer-se que o trânsito na linha é proibido). O acesso, por ser difícil, tem
contribuído para a conservação das pinturas. As pinturas encontram-se num
penedo granítico sobranceiro ao rio Douro. Um outro acesso é procurar o sítio
das Ferraduras, na eira da Codeceira, percurso que se faz facilmente de jipe e
descer pelas fragas até ao local, tendo como referência o túnel referido.
As pinturas são constituídas por um conjunto
de cerca de três dezenas de figuras megalíticas elaboradas com formas
geométricas, quadrangulares com o interior seccionado em xadrez. São encimadas
por dois traços vermelhos. Existem ainda motivos quadrangulares mostrando o
interior segmentado de forma oval ou circular. Foram usados o vermelho cor de
vinho e o azul-escuro, quase negro.
Muitos autores
que têm incluído nos seus trabalhos referências e estudos sobre as pinturas: De
entre eles, Ribeiro Sanches refere que as pinturas da fraga estão associadas a
um pequeno povoado que se encontrava por cima, em pequenos socalcos encaixados
na rocha, que se manteria principalmente à custa da pesca. Porém a primeira
nova data de 1706, em que o Padre António Carvalho da Costa dá a primeira
notícia escrita sobre as pinturas:
“Junto ao Douro
neste sitio aspero, aonde chamão as Letras, està huma grande lage com certas
pinturas de negro, & vermelho escuro quasi emfórma de xadres, em dous
quadros com certos riscos, & sinaes mal formados, que de tempo imemorial se
conservão neste penhasco (…): os naturaes dizem, que estas pinturas se
envelhecem humas, & se renovão outras, & que guarda esta pedra algum
encantamento: porque querendo por vezes algumas pessoas examinar a cova, que se
occulta debaixo, forão dentro mal tratadas, sem ver de quem”.
Este excerto
demonstra que os naturais da região chamavam já às pinturas rupestres “letras”.
De facto na toponímia de sítios com arte rupestre surgem muitas vezes
denominações como Pedra das Letras ou Pedra Escritas. O envelhecimento e a
renovação supracitados deve-se à exposição à luz, e todos aqueles que as
visitam vêm-nas sempre de maneira diferente dependendo do momento do dia e da
estação do ano. O mesmo texto revela ainda uma superstição relativa às
pinturas, acreditando os populares que a pedra teria “algum encantamento”. Eis
um deles:
Ao fundo deste
penedo havia uma entrada para uma gruta, cujo centro ainda ninguém se atreveu a
investigar. Num relatório que António de Sousa Pinto e o reitor João Pinto de
Moraes, mandaram à Academia Real das Ciências, consta que “querendo um clerigo
de Linhares examinal-a, sahiu d’ella mudo, não tornando a recobrar a falla, e
nem por escripto disse o que lá dentro viu. Já se não vê a tal gruta, mas vê-se
o sitio onde, pelos annos 1705, entraram uns desconhecidos, com picões,
alavancas e outros instrumentos, e convidando operarios do logar de Nogarêllo
(aos quaes pagaram generosamente) para os ajudar, romperam a gruta, e consta
que levaram uma grande cruz de prata e outros objectos de valor. Diz-se que no
verão mana das fendas d’este rochedo um betume, semelhante a petroleo. Ao fundo
do penedo, da parte que olha para o Douro, existe um portal, que parece obra da
natureza, e dá entrada para uma grande sala, com assentos em redor, e no meio
uma grande meza, tudo de pedra. N’esta sala ha uma porta, que provavelmente
conduz a outras interiores, que ninguem tem querido examinar. Consta que o
padre Domingos Mendes, na manhã de S. João, do anno de 1678, com sobrepeliz e
estola, pretendeu penetrar n’estas concavidades, em busca de thesouros
encantados; mas que, entrando na segunda sala, sentiu um cheiro tão pestilente,
e teve tal medo, que fugiu tremendo, e ficou mentecapto o resto dos seus dias,
que foram poucos. Também se diz que pouco depois de sahir d’este antro, lhe
cahiram todos os dentes.
No que se refere
à publicação de desenhos de arte rupestre, o exemplo mais antigo conhecido até
hoje surge em 1734, ficando a dever-se a Jerónimo Contador de Argote, e são
relativo a estas pinturas. Trata-se evidentemente de uma reprodução efetuada ao
gosto da época, impregnada de um estilo barroco que se visualiza, por exemplo,
nos anjos que seguram o painel com as pinturas.
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