O
melro, eu conheci-o:
Era
negro, vibrante, luzidio,
Madrugador,
jovial;
Logo
de manhã cedo
Começava
a soltar, dentre o arvoredo,
Verdadeiras
risadas de cristal.
E
assim que o padre-cura abria a porta
Que
dá para o passal,
Repicando
umas finas ironias,
O
melro; dentre a horta,
Dizia-lhe:
"Bons dias!"
E
o velho padre-cura
não
gostava daquelas cortesias.
O
cura era um velhote conservado,
Malicioso,
alegre, prazenteiro;
Não
tinha pombas brancas no telhado,
Nem
rosas no canteiro:
Andava
às lebres pelo monte, a pé,
Livre
de reumatismos,
Graças
a Deus, e graças a Noé.
O
melro desprezava os exorcismos
Que
o padre lhe dizia:
Cantava,
assobiava alegremente;
Até
que ultimamente
O
velho disse um dia:
"Nada,
já não tem jeito!, este ladrão
Dá
cabo dos trigais!
Qual
seria a razão
Por
que Deus fez os melros e os pardais?!"
E
o melro entretanto,
Honesto
como um santo,
Mal
vinha no oriente
A
madrugada clara,
Já
ele andava jovial, inquieto,
Comendo
alegremente, honradamente,
Todos
os parasitas da seara
Desde
a formiga ao mais pequeno insecto.
E
apesar disto, o rude proletário,
O
bom trabalhador,
Nunca
exigiu aumento de salário.
3 comentários:
Se me é permitido, faço duas sugetões:
SELORES E UMA CASA
http://www.youtube.com/watch?v=DJDOzeJeCWQ
......
e
http://www.wook.pt/ficha/um-tiro-na-bruma/a/id/191072
O início do século XX em Portugal ficou marcado por inúmeros acontecimentos que provocaram grandes transformações políticas e sociais: a Implantação da República, em 1910, golpes de Estado e contra-golpes, a participação portuguesa na Primeira Guerra Mundial, as doenças que dizimaram famílias inteiras, ricos e pobres. É neste cenário conturbado com base em factos e personagens reais, que se movimenta a figura central da história, Amadeu. Na qualidade de médico em Macedo de Cavaleiros, a sua vida espelha bem as dificuldades que então havia em ultrapassar a escassez de recursos que assinala este período. Em torno de Amadeu gravitam muitas outras personagens que ilustram primorosamente a sociedade portuguesa de então, e em particular a transmontana, para o desenvolvimento da qual foi essencial a construção da Linha do Tua.
Gosto muito do programa do Guerra Junqueira. Parabéns!
Quando ainda não tinha lido do Guerra Junqueiro senão o poema "A moleirinha", que fazia parte do programa escolar da primária do meu tempo, tinha ouvido muitas vezes um disco de 78 rotações do meu pai, num monólogo cheio de humor de Vasco Santana,em que este actor misturava as letras de "O melro" e de "O fiel". O efeito era, obviamente, um texto de muito humor, quer pelo talento do saudoso actor, quer pelos versos escolhidos e pela forma como foram misturados. Só muito mais tarde viria a ler os poemas que o JAM agora nos oferece. Se ainda conseguirem ouvir o disco do Vasco Santana (editado pela Brunswick), com o título "O melro e o fiel", não desperdicem a oportunidade.
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