Recordar é viver e,
como tal, vamos recuar ao ano de 1950.
Acho eu que toda a gente do concelho de
Carrazeda de Ansiães conhecerá os festejos de Santa Eufémia da freguesia de
Lavandeira, terra bem próxima ao Castelo de Ansiães. Para quem ainda não
conheça, convido-os a procurarem esta romaria que se realiza a 16 de Setembro
de cada ano. Que é animada e onde se compra e come a boa marrã (carne de
porco). Esta é bem conhecida entre os povos do Douro.
Em épocas já perdidas pela
voragem do tempo, vinham multidões em grupos, muitos quilómetros a pé, de zonas
distantes, a fim de assistirem aos festejos da referida santa. Vinham de todas
as direções, tomando os mais variados caminhos que conduzissem a Lavandeira.
Naquele tempo usava-se com frequência o fato. Janota que se prezasse tinha como
figurino de moda o fato, calça e casaco do mesmo pano. Gravata e lencinho
branco de três pontas sobre o bolsinho. As raparigas vestiam o melhor que
tinham e no percurso algumas procuravam poupar o bom calçado, porque o dinheiro
não abundava e não tinham mais que uma par de sapatos e então faziam a
caminhada com calçado mais adaptado às irregularidades dos rudes caminhos e só
calçavam os sapatos logo à chegada à povoação. Todos primavam em mostrar uma
imagem mais consentânea com os grandes momentos de festa, porque era
importante, dado que aí se encontraria muita gente.
Os rapazes e as raparigas
eram dominados pelos mesmos interesses e desejos: divertir, dançar e se
possível arranjar namoro. Conquanto o povo diga: “Namoro de festa é sol de
pouca dura". Querendo dizer que obedece a uma emoção e a um fascínio de
ocasião e que não se prolonga no tempo com seriedade de compromisso. E por
vezes as menos precavidas, embaladas nessa aventura de sonho perdiam-se,
ficando com uma lembrança azeda, porque não valeria pena esperar por quem
pusera os sentimentos fora dessa questão.
Nessa época faziam-se e cumpriam-se
muitas promessas. Vinham lavradores com os seus bois com taleigos de pão sobre
a cabeça e amarrados aos chifres, dando voltas ao redor da igreja; depois eram
os pastores com os seus rebanhos, cuidadosamente limpos. Que conduziam o
rebanho igualmente ao redor daquela, bastando uma vez, para que a ovelha que
chefiava fosse ela a dirigir o rebanho, ele ficava na zona da esquina da
igreja, mais os seus cães. E parece que os rebanhos adivinhavam ser um momento
especial, porque mostravam alegria nas suas vozes. O pastor também se esmerava
melhor. Então ao sinal de comando da sua voz, a chefona interpretava e atendia
de imediato, parando à sua beira. Punha-se à frente do rebanho e seguiam-no.
O
ponto alto da romaria seria a solenidade da sua procissão. Dava-se destaque a
esta. Escolhiam-se os melhores armadores O povoléu agrupava-se à fachada da
bela igreja - uma das mais belas da área- esperando a saída dos andores. A
admiração e o respeito cresciam por essas santas imagens. Depois tomavam uma
ordem, vinham os anjinhos representando figuras bíblicas; crianças cientes das
exigências de seu papel, mas seguidas por mães ou mordomos; o pálio com o sr.
padre conduzindo nas mãos a Custódia e este transportado por as figuras mais
gradas e respeitosas da terra; e a seguir tomava lugar na mesma a briosa Banda
de música, que pelo toque concedia virtude à solenidade; a multidão vinha em
seguida; e por vezes lá vinham senhoras apressadas, de velas acesas,
colocando-se ao lado do santo/a da sua devoção; o fogueteiro atirava ao ar
foguetes de três respostas, que ecoavam pela aldeia e se propagavam por ondas
sonoras às povoações vizinhas; a Banda alinhava e de passo pausado, cadenciado,
iniciava seu lindíssimo toque, apropriado para acompanhar a procissão; os sinos
tocavam e lá seguia a procissão pelas ruas da aldeia, com os belos estandartes
à frente, as lanternas, a imagem do Senhor. As varandas, sacadas e janelas, por
onde esta passava, exibiam o lindo aparato de colchas finas dispostas sobre
estas. E o povo comprimia-se e mais gente ia engrossando o belo cortejo com o
máximo dos respeitos. E de quando em quando lá vinham os foguetes a anunciar a
passagem da procissão, que ao rebentar deixavam no espaço etéreo uma esteira de
fumo, que se esfumava aos poucos.
/ Seguirá numa 2ª
parte.
Armindo Jaime Mesquita
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