29 novembro 2012

O CASO DE ARNAL: João Lopes de Matos



Há muito, muito tempo, vivia eu a minha infância em Seixo de Ansiães, quando isto aconteceu.
Um pobre homem, pacato, respeitador, tinha determinados momentos de loucura medonha.
Neles, gritava pelas ruas, apedrejava qualquer vulto, levando o terror a todos nós, que nos metíamos em casa e fechávamos todas as portas.
Esses momentos passavam, o homem acalmava e, como que acordando, perguntava-se porque não via ninguém. Por vezes, delirava deitado; uma crente(custa-me dizer beata) punha-lhe um crucifixo na mão e fazia o exorcismo do diabo: o homem voltava ao estado normal.
Todos aceitávamos que o ritual tenha de ser este e não víamos outra saída.
Estávamos numa altura em que a crença na ciência era nula.
O homem acabou assassinado por uma navalha de sapateiro.
Há uns anos(três, quatro), numa aldeia perto de Carrazeda, um homem, saído havia pouco da cadeia, começou a sentir que se tornava perigoso porque deixara de tomar os medicamentos que costumava tomar em clausura. Dirigiu-se algumas vezes ao posto da GNR a solicitar que o reenviassem para a prisão. Claro que nunca foi para lá reenviado por não haver razão para tal.
Descontrolado, o pobre homem matou duas pessoas, salvo erro. Imediatamente seguiu para o lugar donde nunca devia ter saído, porque só lá era devidamente tratado.
Aconteceu agora em Arnal que uma pessoa tinha um comportamento que a todos os vizinhos preocupava e que não augurava nada de bom. Agora, a população queria que o homem se tratasse e que não regressasse enquanto constituísse perigo para quem com ele convivia.
Já não pensaram em resolver as coisas com exorcismos e deslocaram-se a Carrazeda a pôr o problema, após um desacato provocado pela pessoa visada, desacato que não foi motivo de prisão. Passados uns dias, o que se temia aconteceu: houve crime de morte e já houve prisão.
Entretanto, morreu um ser humano.
O que se pergunta é se as autoridades não deviam ter tomado medidas. Como se trata de um caso de indivíduo perigoso(mentalmente descontrolado),portanto, um caso médico, devia, em primeiro lugar, ter sido preocupação das entidades de saúde. Havia que arranjar processo de ser medicado e controlado.
Verificando-se haver dificuldade em resolver o problema extrajudicialmente, então podia recorrer-se ao processo prescrito na lei de saúde mental.
Há quem pense(bastonário da Ordem dos Advogados, por exemplo) que a lei de saúde mental não deveria permitir prender, mesmo com ordem do juiz, ninguém, ainda que com a finalidade de o tratar. O tratamento compulsivo constituiria, para quem assim pensa, um grave atentado contra a liberdade humana.
Eu, por mim, penso que há casos em que um indivíduo se torna perigoso porque o seu cérebro funciona mal. Julgo que há que tomar medidas para tratar a pessoa e defender a sociedade.
A referida lei de saúde mental permite fazê-lo. Para quê , em casos flagrantes de demência perigosa, esperar pela prática de um crime que permita a prisão?
João Lopes de Matos

1 comentário:

Anónimo disse...

Em Arnal o que se devia ter passado seria o centro de saúde ter tentado resolver o caso,medicando o indivíduo perigoso. Não sendo isso possível,deveria ser chamado a agir o MP, a solicitação da GNR(o que aconteceu).O MP deveria ter atuado de imediato,dada a perigosidade do indivíduo,já demonstrada na pessoa que ele tinha atacado.O processo previsto na lei de saúde mental é moroso e,por isso, o MP deveria ter atuado com especial diligência,o que ,é evidente,não aconteceu.
JLM