05 maio 2006

Deletério, _ meu bicho poético!

A exaltação do mínimo
e o magnífico relâmpago
do acontecimento mestre
restituem-me a forma
o meu resplendor.

(...)

A magnólia,
o som que se desenvolve nela
quando pronunciada,
é um exaltado aroma
perdido na tempestade,

um mínimo ente magnífico
desfolhando relâmpagos
sobre mim.

Luiza Neto Jorge, in poesia, 1960-69

Sobre um dos pré-lançamentos de meu livro As letras como poesia, muito tenho de agradecer a todos _ _ que compareceram ao Auditório do Centro de Apoio Rural, dia 29 de Abril, para uma breve exposição video e aúdio... de cerca de duas horas, em terapia musical. Aliás,
o lançamento será apenas no dia 13 de Maio, no 'Maus Hábitos', à rua Passos Manuel do Porto, pelas 23 horas, com a presença do escritor Valter Hugo Mãe, editor da Objecto Cardíaco, e Ana Deus, voz dos Três Tristes Tigres.

Só para dizer ainda que este livro tem alcançado os seus objectivos. O primeiro — de que poucos cúmplices textuais têm começado pelo princípio, mas como bons leitores de jornal, pelo fim, ao Posfácio, que contém várias linhas de leitura. Como
no blog — sob o bom princípio da última voz ser notícia, por mais fresca _ sardinha. Objectivo conseguido.

Depois, porque cada um constrói este livro como deseja. Adolfo Luxúria Canibal, por exemplo, começou pelo Posfácio, depois pelos bens da Mão Morta, pelo Oporto wine show de Reininho e pela Morte do Amor e o Amor da Morte dos Ornatos Violeta. Rui Reininho ficou ‹‹cliente,
pelo peso da obra››, interessando-se depois de GNR, pela Fossanova dos Belle Chase Hotel. &tc.
É evidente que todos aqueles habituados a leituras na diagonal dos periódicos, estranham... O livro obriga-os a recuperar as linhas de um sorriso vertical. Como José Bragança de Miranda viu sobre o freudismo: ‹‹em confronto com a alucinação quotidiana, esse misto de electricidade, dinheiro e substâncias aditivas››, faltava um algoritmo capaz de apreender as ligações fascinantes, os desvios erráticos, as ilusões vitais, que uma análise racional jamais se daria conta. Daí que eu adore essa obra aberta — ao desejo de cada um, partir por caminhos seus, nunca dantes navegados, mesmo em lapsus linguae, esses actos falhados — reflexo do nosso inconsciente, (n)uma interferência entre intenções opostas que entram em conflito. (Cf. o processo de construção na lírica de Rui Reininho).

Concedo, no entanto, como no poema A magnólia, que o meu trabalho vai da exaltação do (máximo: esse relâmpago no) mínimo... E que, de tanto compactado, alguns se vejam gregos no pedestal. De todo o modo, há sempre uma tradução para latim. E como dizia uma amiga minha, construa o seu caminho dos vários propostos. Como num disco mais interessante que não entra à primeira, pois nos obriga a conhecer. Objectivo conseguido, digo eu.
— Que hei-de fazer? É o meu bicho poético. Deleté_
rio, por demoníaco, destrói, revelando _ meu pior inimigo: eu-próprio. E a ideia da suprema originalidade, na ‹‹caixa negra›› da psique.
— Que hei-de fazer? Se cada vez me sinto mais natural, mais conforme naquilo que vou sendo? Com mais atavios semânticos e formais, _ _ sinto despir da minha insegurança...

Mas também não tenho por fim conceber instalações de uns pós modernos... De um génio incompreendido, senão pelo crítico que o cauciona.
Pois, como Mário Cláudio, em entrevista ao JL, não tenho afinidades à forma pela forma, nem hei medo ‹‹de afirmar que um tijolo no meio da sala de exposições, poderá sempre ser uma exposição, mas será sempre uma exposição de merda, e que os familiares desse tipo de Inquisição, arautos do óbvio academismo em que a vanguarda caiu, ao condenar-nos por reagir assim, são tão de merda como a exposição que propõem.››


Um abraço,

vitorino almeida ventura

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