14 novembro 2005

O desporto radical de Gilberto Pinto

São as distracções que levam ao choque frontal
As pequenas crueldades incitam ao choque frontal
O tráfego nas cidades leva ao choque frontal
Rui Reininho, Psicopátria do GNR

Sobre A Casa da Prelada, para mim — um romance maior, conversei com o autor, Gilberto Pinto: metade da entrevista a sair já ao mês de Novembro, n’ O Pombal, segundo _ seu director Carlos Fernandes. Entrevista didáctica, pois tentámos colocar dúvidas na perspectiva do Outro — esse aluno da Escola Secundária, em contrato de leitura, para que tenha mais pistas na viagem... E, ao fim, haja literalmente chegado a um outro ponto (sem sair do seu lugar).
E mesmo se num ou noutro . houve divergência, como Einstein soubemos criar um acontecimento! No poder re_
criar a partir daí, Leitor e Autor, _ _ sentidos do texto... Sobre a nossa Condição Humana. Gilberto Pinto, num absoluto, sem haver medo de se mostrar como é: Culto... (n1 país que inveja o mérito dos seus iluminados), sem nunca o discurso auto-regular o medo, em nome da radical criatividade da sua obra, disse:
‹‹Quis deixar insinuações, motivos, fragmentos (e daí os silêncios), para fugir ao explícito, que seria sempre vulgar. Se for o leitor a acabar a construção, ela será na sua mente mais intensa e 'verdadeira'. Claro que o risco existe: o de o Leitor absorver o texto de forma leviana, incompetente, superficial. Mas não foi para esse Leitor que o texto se fez.››.
Que a proposta de Gilberto Pinto é a que Maurice Blanchot n’ O livro por vir formulou: Escrever sem escrita, conduzir a literatura a esse ponto de ausência onde desaparece. Eis o ‹‹grau zero da escrita››, 2º Roland Barthes, a neutralidade que todo o escritor busca, deliberadamente ou sem se dar conta, e que leva alguns ao silêncio. E A Casa da Prelada é isso mesmo — um caminho exterior, nos capítulos ímpares, de um diálogo que se apresenta como monólogo, sob a voz de Alberto Guimarães (já que espelha as reacções do sr. inspector e do agente), e depois, um não exclusivo, _ _ caminho interior, de monólogos, aos capítulos pares, respectivamente de Ni, Bela e Eva: Eva que dispensa mesmo a manifestação de uma voz — tudo lhe ocorrendo em consciência. Escutar o silêncio é pois seu caminho...
Em muitas livrarias colocado (ironicamente) nas prateleiras do policial, o livro centra aos nossos pequenos e grandes 'crimes' familiares, como o egoísmo fechado nas paredes de um escritório, o incesto, ou pior: a violação de... Como diria Rui Reininho, ‹‹as distracções (...) as pequenas crueldades (...) o tráfego nas cidades leva ao choque frontal››... Mero acidente? A re_
flectir sobre... ‹‹A procura do eu. Só isso importa. E o eu não está à flor da pele, mesmo se aí existam algumas das suas manifestações. E só o romance que tente essa busca tem o direito de existir. O resto... são árvores mortas para nada... só aumento de entropia.››. Que assim continue, Gilberto Pinto. E
sob os vidros quebrados de um jogo d’ espelhos da Tempestade, central no romance, nos deixe ver os raios de um Sol avassalador.

vitorino almeida ventura

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